“O Brasil, um gigante econômico e cultural, se mantém um anão diplomático”, afirmou em 2014 um porta-voz da chancelaria israelense, em resposta a uma nota de condenação brasileira a ações de Israel na Faixa de Gaza, sem que o governo Dilma Rousseff dissesse uma única palavra de crítica às centenas de lançamentos de foguetes dos terroristas do Hamas contra a população civil israelense. Era uma qualificação adequada não por uma suposta irrelevância do Brasil – se assim fosse, os israelenses nem teriam se dado ao trabalho de responder a nota brasileira –, mas pelo péssimo hábito do governo petista de fazer as escolhas erradas, alinhando-se a terroristas e ditadores mundo afora enquanto desprezava alianças com democracias sólidas. Um hábito que, a julgar pela recente entrevista do ex-presidente, ex-presidiário e ex-condenado Lula à revista norte-americana Time, segue firme e forte.
Segundo Lula, o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, é “tão culpado” pela invasão de seu país quanto o verdadeiro agressor, Vladimir Putin – o petista, inclusive, faz mais críticas ao ucraniano que ao russo ao longo da entrevista. “Ele [Zelensky] quis a guerra. Se não quisesse, teria negociado um pouco mais”, disse Lula, para quem as aparições do ucraniano em parlamentos europeus são um “espetáculo” e uma “campanha política”, e não um pedido de ajuda. Para Lula, o mestre das soluções tão simplistas quanto absurdas, bastaria que Zelensky quisesse “negociar um pouco mais”, ou abandonar a ideia de entrar na Otan ou na União Europeia, e a paz reinaria. “Esse presidente da Ucrânia poderia ter dito ‘vamos parar por um tempo com esse papo de Otan, de entrar na União Europeia, vamos discutir isso mais um pouco’”, afirmou o petista, para quem “eles poderiam ter negociado por 10, 15, 20 dias, um mês inteiro, tentando achar uma solução”.
Ao culpar a vítima pela agressão sofrida no caso da Ucrânia, Lula mostra que quer ressuscitar alinhamentos diplomáticos que já desmoralizaram o Brasil diante de todo o mundo
A boquirrotice de Lula é uma verdadeira ofensa aos ucranianos, que já vêm discutindo há quase uma década que direção querem dar a seu país, e escolheram escapar da órbita russa e buscar maior integração com o ocidente. Ao menos desde a anexação ilegal da Crimeia, em 2014 (um fato que Lula omite de forma muito conveniente), os ucranianos sabem que não podem confiar em Putin – como agora também o sabem finlandeses e suecos, que consideram abandonar uma postura mais neutra e pedir sua admissão na Otan. Há muito tempo já estava claro, da parte da Rússia, que a única condição para a distensão – não para uma verdadeira paz – seria a Ucrânia simplesmente abrir mão do direito de decidir seu próprio destino, submetendo suas relações exteriores ao Kremlin. Mas recusar tamanha submissão, para Lula, é “querer a guerra”.
Lula ainda afirmou que, “se fosse presidente do Brasil, e eles me dissessem ‘o Brasil pode entrar para a Otan’, eu diria não”, porque “o Brasil não tem disputas com nenhum país, nem Estados Unidos, nem China, nem Rússia, nem Bolívia, nem Argentina, nem México”. Aponte-se, de imediato, o absurdo de querer fazer qualquer paralelo entre um país que não tem nenhum tipo de disputa territorial e um país que é vizinho de uma superpotência nuclear, já foi vítima de uma agressão passada e continua a ser constantemente ameaçado. Mas a hipotética negativa de Lula faz sentido. O petismo sempre desprezou acordos e alianças políticas e econômicas com as democracias ocidentais, preferindo abraçar ditadores, autocratas e carniceiros na América Latina, na Ásia, na África e no Oriente Médio. Foi assim, por exemplo, que Lula e o PT trocaram a perspectiva de fazer do continente americano uma área de livre comércio pela transformação do Mercosul em um clubinho ideológico bolivariano, ou que arriscaram uma crise diplomática com a Itália para proteger o terrorista e assassino Cesare Battisti.
Em outras ocasiões, Lula e outros membros do alto escalão petista já afirmaram que trarão de volta o modelo econômico que levou o país à lona em 2015 e 2016 – à Time, evidentemente, o ex-presidente preferiu repetir a mitologia que atribui apenas a ele todos os bons resultados de seu mandato, ignorando a “herança bendita” recebida de Fernando Henrique Cardoso e o momento internacional favorável às commodities. Agora, ao culpar a vítima pela agressão sofrida no caso da Ucrânia, Lula mostra que também quer ressuscitar alinhamentos diplomáticos que já desmoralizaram o Brasil diante de todo o mundo.
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