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Editorial

André Mendonça no STF

André Mendonça, titular da Advocacia-Geral da União (AGU).
André Mendonça, ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), foi confirmado por Bolsonaro ao STF. (Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil)

Ao contrário da primeira indicação de Jair Bolsonaro para o Supremo Tribunal Federal, quando o presidente surpreendeu ao nomear Kassio Nunes Marques para a vaga de Celso de Mello, desta vez não houve surpresas. O presidente confirmou a esperada nomeação do advogado-geral da União, André Mendonça, para o lugar de Marco Aurélio Mello, que se aposentou nesta segunda-feira. Mendonça, que também foi ministro da Justiça, também é pastor presbiteriano, ou seja, cumpre o perfil de “terrivelmente evangélico” que Bolsonaro havia antecipado inúmeras vezes a apoiadores.

A religião de um ministro do Supremo pouco importa, e isso não deveria ser obstáculo a uma indicação. O Senado brasileiro não pode repetir o deplorável espetáculo de seu equivalente norte-americano nas audiências de confirmação de Amy Coney Barrett, indicada para a Suprema Corte por Donald Trump. Na ocasião, os ditos “progressistas” diziam abertamente que Barrett não seria uma boa justice (como são chamados os membros da Suprema Corte) por ser católica convicta, uma demonstração inequívoca de preconceito antirreligioso. Mas tampouco ser “terrivelmente evangélico” tem de ser o critério principal para um indicado ao Supremo – é preciso que seja terrivelmente bom.

A religião de um ministro do Supremo pouco importa, e isso não deveria ser obstáculo a uma indicação

E, por “terrivelmente bom”, entendemos alguém que seja portador de uma série de qualidades que andam em falta na instância mais alta do Judiciário brasileiro, inclusive um conjunto de sólidas referências morais na defesa da dignidade intrínseca do ser humano e da importância da família como célula básica da sociedade. Posturas importantes nesse sentido, como a proteção da vida desde a concepção e convicções a respeito da natureza do casamento e da família, são posicionamentos éticos e morais que qualquer um pode e deve ter, independentemente de sua fé (ou ausência dela). É verdade que, mais recentemente, as igrejas cristãs se tornaram as principais defensoras destas convicções e, por este ângulo, podemos entender o “terrivelmente evangélico” como alguém que fará a defesa dessas plataformas no STF. Mesmo assim, é bastante evidente que um ministro do Supremo que seja cristão não poderá usar argumentos religiosos em seus votos, mas, na linha do que propõe o filósofo político John Rawls, terá de empregar noções que sejam compreendidas e compartilhadas mesmo por quem não tem a mesma fé.

A clareza moral, no entanto, não é o único requisito que fará um ministro ser terrivelmente bom. Dele também esperamos firmeza no combate à corrupção, ainda mais nestes tempos em que é justamente o STF o grande responsável por estar desmontando esse combate no Brasil. Um bom ministro do Supremo ainda precisa ter a convicção de que os grandes protagonistas da vida nacional são os indivíduos, a sociedade civil e o setor privado, rejeitando estatismos e corporativismos. E, por fim, deve ser um opositor firme do ativismo judicial, rejeitando todas as tentativas de transformar o Supremo em legislador, seja por meio de seus votos na turma ou em plenário, seja quando for preciso proferir decisões monocráticas em ações e recursos dos quais ele seja relator.

Todas essas características deveriam compor as prioridades dos senadores que irão sabatinar Mendonça, mas, no caso do advogado-geral, há episódios específicos que também merecerão atenção dos senadores e esclarecimentos da parte do nomeado. Inclui-se neste rol a preocupante ligeireza com que Mendonça, durante sua passagem pelo Ministério da Justiça, usou a Lei de Segurança Nacional para investigar manifestações críticas ao presidente Bolsonaro – recurso que, justiça seja feita, não foi exclusividade de Mendonça, tendo sido usado também pelo próprio Supremo em casos recentes, como o do deputado Daniel Silveira.

O Senado, portanto, tem material mais que suficiente se quiser realizar uma sabatina digna do nome, ao contrário da constrangedora sessão que terminou com a aprovação do nome de Nunes Marques. Proteção da vida e da família, rejeição ao ativismo judicial, firmeza contra a corrupção, respeito à Constituição e aos direitos individuais devem ser a espinha dorsal da sabatina, com os senadores efetivamente cumprindo sua missão constitucional.

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