Há quase um ano, em 21 de agosto de 2019, o ministro Paulo Guedes lançava um programa nacional de privatizações, cuja meta era conseguir R$ 1 trilhão com venda de estatais. A declaração do ministro foi feita no âmbito do anúncio da lista de empresas estatais colocadas à venda, como etapa inicial da execução do programa. Pela ideia do governo, a venda de estatais não deveria ser feita de uma vez só, a fim de evitar a redução do preço das empresas, pois os recursos financeiros são limitados, um mesmo grupo empresarial pode desejar comprar mais de uma estatal e os esquemas de financiamento teriam dificuldades em atender a tudo ao mesmo tempo.
Alguns críticos acusaram o programa de ser tímido e longe das 50 estatais que o presidente Jair Bolsonaro, na campanha eleitoral, dizia elegíveis para venda, por serem deficitárias ou terem atividades alheias às funções do governo. Naquele agosto de 2019, o governo listou as estatais incluídas no pacote da primeira etapa: Telebrás, Correios, Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores e Garantias (ABGF), Empresa Gestora de Ativos (Emgea), Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), Dataprev, Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), Centro de Excelência em Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec), Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp). Além delas, Eletrobrás, Casa da Moeda, Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre SA (Trensurb), Centrais de Abastecimento de Minas Gerais (Ceasaminas) e Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa), que já tinham a privatização ou estudo para venda aprovado, seja na gestão Bolsonaro, seja no governo anterior, de Michel Temer, foram mantidas na lista.
O primeiro aniversário do anúncio do programa de privatização está eivado simultaneamente de esperança e muita preocupação
Vale recordar que há uma série de argumentos para justificar que o governo federal, proprietário ou participante direto de 130 companhias, venda empresas estatais. A privatização faz valer o princípio da subsidiariedade, retirando o governo de atividades tipicamente privadas; isso aumenta a competição e a liberdade econômica, e melhora a eficiência da economia, pois o setor privado é melhor gerente que o setor público – o que, por sua vez, melhora a ética pública pela redução das oportunidades de corrupção e desvio de dinheiro público, a exemplo do que ocorreu no mensalão e no petrolão. Ao repassar à iniciativa privada aquilo que ela é capaz de fazer, o governo fica livre para focar suas ações em serviços públicos e melhorar sua capacidade de investimento nos setores onde é mais necessário, especialmente obras de infraestrutura física e infraestrutura social. Por fim, a venda das empresas gera receitas para a redução do déficit público e contribui para a redução da dívida pública.
Há tempo o mundo vem constatando, inclusive em países socialistas, o crescente grau de falência moral do Estado-empresário e seus atributos negativos como rigidez, ineficiência, atraso, desperdício, corrupção, desobediência dos imperativos da competição e risco de falência. O Brasil não escapou de um mal comum na América Latina: a enorme dificuldade de avaliar a eficiência das empresas estatais, em razão de seus privilégios de mercado, monopólios e vantagens fiscais, de um lado, e de terem seus déficits cobertos com dinheiro público, de outro. Ademais, uma vez instalada, a empresa estatal conta com um poderoso lobby de defensores e protetores, como sindicatos, parlamentares, partidos de esquerda, políticos estatizantes e burocratas beneficiados por mordomias e privilégios dela derivados.
O aniversário de um ano desde o anúncio do programa de privatização do primeiro lote de estatais coincide com o pedido de demissão de Salim Mattar, até a semana passada titular da Secretaria Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do Ministério da Economia. Ele pediu para sair sob a justificativa de não ter conseguido vencer a máquina pública rígida, a burocracia resistente e os beneficiários da estatização, que não aceitam alguém de fora e bloqueiam as iniciativas de privatização. A máquina estatal é um gigante ineficiente, corrupto e desperdiçador de dinheiro público que expele para fora do governo quem ousa enfrentar o statu quo. As dificuldades do secretário aumentaram há pouco mais de um mês, após ele ter anunciado um plano de privatização ou concessão de 12 estatais para 2021. Embora Salim Mattar tenha construído a fama de bom executivo e organizado quanto à estratégia para o cumprimento de sua missão privatizante, ele não conseguiu vencer os obstáculos e resistências da máquina pública e do espectro político incrustado no parlamento.
Após Paulo Guedes ter aceito a demissão de Salim Mattar, a secretaria passa a ser ocupada pelo engenheiro mecânico Diogo Mac Cord, que era titular da Secretaria de Desenvolvimento da Infraestrutura do Ministério da Economia. A expectativa é de que a troca de comando ajude no avanço do cronograma de privatizações, pois tanto o presidente da República quanto seu ministro da Economia serão julgados pela capacidade de execução de uma importante promessa de campanha: privatizar e a reduzir o Estado-empresário – um mau empresário, a julgar pelos elevados déficits de boa parte das empresas estatais, que se tornaram consumidoras de dinheiro do Tesouro Nacional, ou seja, dinheiro do povo.
O primeiro aniversário do anúncio do programa de privatização está eivado simultaneamente de esperança e muita preocupação. Esperança de que o processo continue e consiga obter algum sucesso, por ser tão necessário pelas razões já expostas; e preocupação pela continuação do boicote e resistência da burocracia estatal e do mundo político, sobretudo daqueles que vivem sob as vantagens das empresas estatais, mesmo as mais absurdas e ineficientes. Reformar a estrutura do Estado e modernizar seu funcionamento, para o que o programa de privatização é fundamental, são objetivos de interesse da sociedade, necessários para o país crescer e se desenvolver.
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