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editorial

Aparelhamento em curso

O novo presidente do Cade omitiu, em seu currículo, o fato de ter trabalhado para o político que iniciou as denúncias que agora o órgão antitruste terá de julgar

O PSDB formalizou um convite para que o presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Vinícius Marques de Carvalho, explique na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado omissões no currículo apresentado quando de sua nomeação para o posto que ocupa agora. O partido ainda apresentou uma representação na Procuradoria-Geral da República (PGR) para que Carvalho seja investigado pelo mesmo motivo. Os parlamentares tucanos apontam sinais de que uma prática relativamente comum no petismo, o aparelhamento da máquina de Estado pelos militantes do partido, estaria se repetindo, dessa vez no órgão que, entre outras atribuições, avalia grandes fusões e aquisições, e fiscaliza denúncias de práticas econômicas que violam a livre concorrência.

Carvalho foi indicado por Dilma Rousseff para substituir Fernando Furlan; seu nome foi aprovado pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado e a nomeação ocorreu em maio. Mas o currículo de Carvalho tinha sido enviado pela Casa Civil para apreciação da Presidência em maio do ano passado, com uma lacuna importante: o tempo em que trabalhou como chefe de gabinete do deputado estadual paulista Simão Pedro, do PT, entre 2003 e 2004. Foi justamente esse parlamentar, que hoje é secretário do prefeito paulistano, Fernando Haddad, que denunciou, em 2010, um escândalo de formação de cartel nas licitações dos metrôs de São Paulo e Brasília. A empresa alemã Siemens assinou um acordo de leniência com o Cade para detalhar o funcionamento do esquema ao órgão antitruste, que àquela altura já tinha Carvalho na presidência.

O novo presidente do Cade, confrontado com a omissão em seu currículo, minimizou o episódio, dizendo que "provavelmente foi um lapso". O caso do cartel metroviário é extremamente grave e precisa ser investigado com toda a seriedade; se as irregularidades forem comprovadas, é preciso punir os responsáveis. Mas não há como não notar uma série de coincidências envolvendo o caso. Afinal, um militante petista – a assessoria do Cade informou que Carvalho tinha se desfiliado do partido havia muitos anos, mas seu nome aparece na lista enviada pelo PT ao Tribunal Superior Eleitoral em 19 de abril, e que pode se consultada no site do TSE; sua situação de filiação é descrita como "regular" –, vinculado a um político que denunciou um escândalo envolvendo partido adversário, é nomeado para a presidência do órgão que julgará essa mesma denúncia, às vésperas de uma corrida eleitoral em que uma das maiores ambições do PT é retirar o PSDB do governo paulista. Não há dúvidas de que o episódio servirá como munição na campanha de 2014.

A confusão entre partido e Estado, e o consequente loteamento desse aparelho de Estado com militantes petistas, em alguns casos, vêm custando muito caro; basta observar o que ocorreu com a Petrobras, cuja gestão desastrosa vem demolindo o valor de mercado da estatal. O Cade tem uma função valiosa no aprimoramento da concorrência econômica no país, e mais recentemente ganhou novos poderes, pela Lei 12.529/2011. É um órgão que não pode, de maneira alguma, ser colocado a serviço de interesses partidários. Do contrário, criará distorções que também punirão o consumidor brasileiro.

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