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Os atos secretos em série, usados pelos se­­nadores para nomear parentes e reajustar seus próprios salários, entre outros desvios, não passaram despercebidos aos eleitores brasileiros. Ainda bem. A noção exata das medidas decorrentes dos acordos políticos que atropelam quaisquer regras em nome da permanência no poder é vital para que o cidadão busque a transformação – e não apenas pelo voto, mas principalmente pela consciência da distância entre marketing e realidade. Da distância entre o PT da propaganda política, grande defensor da ética na vida pública, e o PT que, após alcançar o poder, adota um pragmatismo político sem precendentes para manter-se nele. Tudo o que se passou no Senado está gravado na memória dos cidadãos mais atentos.

Diante do quadro, é surpreendente que a imagem do Senado tenha, em boa medida, escapado do desgaste geral. É o que revela um levantamento nacional feito pelo Instituto Análise, divulgado nesta semana. A sondagem indica que o eleitor faz distinção entre a instituição e seus ocupantes temporários. Dos mil entrevistados no levantamento realizado no fim de agosto, 52% disseram concordar com a premissa de que o Senado é importante, assim como a Câmara, para "aprimorar as leis".

Na mesma pesquisa, o porcentual dos que indicaram que o Legislativo brasileiro pode seguir adiante somente com a Câmara foi de significativos 35%. Mas talvez o dado mais animador do levantamento esteja oculto no que o eleitorado não disse: se há brasileiros dispostos a prescindir do parlamento, eles estão diluídos entre os 13% que não souberam ou não quiseram responder. Um saldo favorável e tanto considerando-se um cenário político de tantos desmandos no Senado e, não nos enganemos, também na Câmara e em outras instâncias do governo.

Os numerosos escândados do governo federal – mensalão, dossiês, condução da crise aérea, dentre outros – mostram que o presidente Lula não tem medido esforços para defender as oligarquias que sustentam seu governo. O pacto entre a velha oligarquia, bem personificada por José Sarney, e a nova elite de Lula é a etapa final de uma história anunciada, ao menos para aqueles que intuíam aonde chegaria o partido de inspiração marxista, disposto a pagar qualquer preço pelo poder.

A bandeira da ética – está claro – serviu bem para a propaganda ilusória. A máquina pública foi loteada e aparelhada pelo PT de modo a criar uma rede de proteção para o projeto político de perpetuação no poder. Nesse processo, incluiu-se também a ingerência do governo no Le­­gislativo, um dado que também transpareceu na sondagem do Instituto Análise. Pouco mais de um terço dos mil entrevistados afirmaram que o presidente tem como atribuição aprovar leis para o país. O que parece ser mero engano quanto ao papel dos poderes pode ser lido também como uma percepção da pressão, por meio da oferta de cargos e favores, do Executivo sobre os parlamentares.

O resumo da ópera é que o eleitor não é tolo. Sabe da importância do Legislativo e não embarca na perigosa ideia de um Congresso fechado. Resta agora canalizar essa percepção para um cenário em que a distinção dos três poderes que sustentam a democracia seja mais clara. Um cenário em que a vida pública não seja regida pela ânsia de poder a qualquer preço.

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