Em um país que, na contramão das nações desenvolvidas, ainda aposta na malha rodoviária como o principal meio de escoamento de tudo o que produz, cada relatório anual da Confederação Nacional do Transporte (CNT) é motivo de profunda lamentação. Na edição 2017 da pesquisa, que inclui todas as rodovias federais pavimentadas e importantes rodovias estaduais, constatou-se o tamanho da deterioração: a porcentagem de estradas consideradas “regulares”, “ruins” ou “péssimas” é de 61,8% neste ano, contra 58,2% em 2016. As notas consideram itens como pavimento, sinalização, geometria da via e estrutura de apoio.
E, para quem considera que as rodovias em mau estado são um fenômeno restrito às regiões mais pobres do país, como Norte e Nordeste, o relatório da CNT é uma ducha de água gelada. É verdade que as unidades da Federação com pior resultado estão nessas regiões, como Acre, Amazonas, Amapá ou Rio Grande do Norte, mas a soma das estradas “regulares”, “ruins” e “péssimas” chega a 59,9% no Paraná, 63,7% em Santa Catarina, 62,2% no Rio Grande do Sul e 69,8% em Minas Gerais – das dez piores ligações rodoviárias brasileiras, segundo o relatório, duas estão na Região Sul: entre Barracão e Cascavel, no Paraná, e entre Florianópolis e Lages, em Santa Catarina. Isso mostra como o fenômeno da deterioração rodoviária é generalizado, com poucas ilhas de excelência, como São Paulo, que tem 46,6% de rodovias consideradas “ótimas” e onde estão localizados todos os dez melhores trechos na avaliação da CNT.
A diferença mais significativa não é regional, mas de gestão
A diferença mais significativa não é regional, mas de gestão. Das rodovias administradas pelo Estado, 34,1% são consideradas “ruins” ou “péssimas”, índice que é de 3% nas estradas concedidas à iniciativa privada. Na ponta oposta, apenas 3,3% das rodovias com gestão estatal são avaliadas como “ótimas”, contra 32,6% das estradas concedidas. A explicação para isso vai além do princípio geral segundo o qual a infraestrutura de transporte está melhor nas mãos da iniciativa privada que nas de um Estado que precisa dedicar atenção e investimento a vários assuntos e acaba negligenciando muitos deles. Desde 2011 – ou seja, a partir do governo Dilma –, as verbas federais para o transporte rodoviário estão em queda. Mais uma consequência nefasta da ideologia que mergulhou o país na crise.
O presidente da área de transportes rodoviários da CNT, Flávio Benatti, afirmou que “a única saída para a situação são as concessões rodoviárias”, mas acrescentou que a entrega das rodovias à iniciativa privada não pode ser feita de qualquer forma, e citou o caso das concessões que estão sendo devolvidas. Outro caso emblemático é o do Paraná, em que decisões unilaterais de redução na tarifa tomadas décadas atrás deram origem a um imbróglio que parece não ter fim e no qual se tornou quase impossível saber quem tem razão; de certo, mesmo, só o fato de que o estado apresenta, ao mesmo tempo, rodovias concedidas com pista simples e algumas das tarifas mais altas de pedágio.
Leia também: Concessões viárias para reduzir o custo Brasil (artigo de Sérgio Souza, publicado em 30 de dezembro de 2016)
Benatti diz que, em média, o produtor brasileiro gasta 27% a mais graças ao mau estado de conservação das rodovias, percentual que sobe para 90% no caso das estradas consideradas “péssimas”. Nossa malha rodoviária tira competitividade do país, aumentando custos e prazos. Sem investimento pesado não apenas nas rodovias, mas especialmente em outros modais, como o ferroviário, o crescimento nacional continuará parando nas crateras que enfeitam estradas de norte a sul do Brasil.