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Primeiro-ministro britânico, Boris Johnson
Boris Johnson, primeiro-ministro britânico.| Foto: AFP

Em pouco mais de um mês, o novo primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, já acumulou uma manobra altamente controversa e derrotas significativas. Disposto a realizar o Brexit – a saída do Reino Unido da União Europeia – até o dia 31 de outubro, com ou sem acordo, Johnson recorreu a uma prerrogativa do cargo e, no fim de agosto, pediu que as atividades do Parlamento fossem suspensas por cinco semanas, entre 10 de setembro e 13 de outubro, com o objetivo de bloquear novas discussões que pudessem adiar ainda mais o rompimento. A decisão, no entanto, teve um efeito quase contrário, iniciando uma rebelião dentro do Partido Conservador.

Em uma sequência de votações ocorridas na semana passada, o Parlamento resolveu, primeiro, tomar de Johnson o controle da agenda do Brexit; depois, garantir que não haverá Brexit sem um acordo com a UE a respeito dos termos da saída britânica. O resultado só foi possível porque cerca de 20 conservadores votaram contra o premiê, o que lhes garantiu a expulsão do partido. Johnson ainda tentou uma manobra arriscada: conseguir a convocação de novas eleições, na esperança de que o eleitorado votasse em parlamentares mais comprometidos com o Brexit, mas também acabou derrotado – o principal partido de oposição, o Trabalhista, recusou a proposta e, com ela, a possibilidade de se tornar maioria na Câmara dos Comuns, alegando que primeiro é necessário ter certeza absoluta de que o chamado “no-deal Brexit” não acontecerá.

Nem foi preciso esperar que um Brexit sem acordo ocorresse para que o Reino Unido entrasse em uma situação caótica

Johnson pretende voltar à carga na segunda-feira, com o Parlamento ainda em atividade enquanto aguarda a sanção real da lei aprovada na semana passada. A data importa porque, com uma nova eleição em 15 de outubro, já haveria um primeiro-ministro eleito pelo povo participando da reunião de cúpula da UE prevista para 17 e 18 de outubro. Se não apoiar uma nova eleição, a oposição trabalhista tem algumas opções. Ela pode manter Johnson em banho-maria, liderando um governo de minoria que não conseguiria aprovar nenhuma medida radical sobre o Brexit, mas correndo o risco de ver chegar o dia 31 de outubro – data estipulada pela União Europeia, é preciso dizer – sem nenhuma definição sobre os termos da saída, já que Johnson é enfático ao dizer que não pedirá aos europeus uma extensão do prazo.

A outra alternativa seria promover um voto de desconfiança contra Johnson, derrubando-o e dando ao líder trabalhista, Jeremy Corbyn, a missão de formar um novo governo e negociar com Bruxelas. Os trabalhistas, no entanto, também não têm maioria, fazendo da moção de desconfiança uma enorme aposta que poderia, no fim, terminar com uma nova eleição – tanto é assim que não está excluída a possibilidade de o próprio Johnson pedir um voto de confiança. Esse tipo de atitude não chega a ser uma medida incomum e já foi usada por premiês em apuros, em uma tentativa de reconquistar apoio. Mas desta vez os britânicos poderiam presenciar uma situação bizarra, com os conservadores votando contra seu próprio governo para forçar sua queda e uma nova eleição se os trabalhistas não conseguissem montar um gabinete; por outro lado, os trabalhistas votariam a favor de Johnson para evitar esse desfecho.

Assim, nem foi preciso esperar que um Brexit sem acordo ocorresse para que o Reino Unido entrasse em uma situação caótica. Para Johnson e os partidários da política do “ou vai ou racha” quanto ao Brexit, os parlamentares – mesmo os conservadores – estão tentando contornar a voz do povo. Afinal, em 2015 o então primeiro-ministro David Cameron só venceu as eleições porque prometeu realizar o plebiscito sobre a saída britânica, mesmo sendo contrário ao rompimento. E, em 2016, o Brexit venceu, ainda que por pequena margem, levando à renúncia de Cameron. O sucesso do Partido do Brexit, de Nigel Farage, nas eleições de maio deste ano para o Parlamento Europeu mostrou que muitos britânicos continuam endossando a saída, e são eles que consideram incompreensível a demora para que o resultado do referendo se torne realidade.

A desconfiança tem alguma razão de ser – enquanto muitos parlamentares estão apenas tentando garantir os melhores termos possíveis para o Reino Unido no rompimento, efetivamente houve os que apostaram no impasse para conseguir um segundo referendo, na esperança de que desta vez vencesse a posição pela permanência na UE. Este é o drama britânico: diante do afã hiper-regulatório que realmente existe por parte das autoridades europeias, o Reino Unido escolheu sair em vez de ficar e lutar por uma União Europeia menos centralista e mais fundamentada no princípio da subsidiariedade. E, agora, o país se vê quase paralisado porque seus parlamentares não conseguem se entendem sobre como cumprir o que a população decidiu.

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