Para um brasileiro comprometido com a defesa da vida da concepção até a morte natural, e que leva esta preocupação consigo para a urna, importa tanto o voto para o Executivo quanto para o Legislativo. Já há um bom tempo os eleitores pró-vida entenderam que também é preciso eleger bons legisladores, pois é do Congresso Nacional e, em menor parte, das Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais que partem leis que incentivam o respeito à vida nascente ou que, no caso federal, podem tornar a lei penal mais leniente com a prática do aborto. Neste sentido, o Congresso que emergiu das eleições de 2 de outubro oferece razões de otimismo, seja pela configuração partidária, seja pela vitória de nomes bastante combativos tanto na Câmara quanto no Senado.
Mas isso não significa que o voto para o Executivo será de menor importância, por vários fatores. Em primeiro lugar, a depender do resultado do segundo turno da eleição presidencial, haverá mudanças. Partidos em que ideologias e plataformas morais importam menos, e que hoje estão na base aliada de Jair Bolsonaro, poderão muito bem migrar para o apoio a Lula em caso de vitória do petista, sem falar nas mudanças individuais de parlamentares em direção ao governismo na primeira janela partidária que se abrir. O petismo jamais governou sem maioria razoável no parlamento – ainda que essa maioria tenha sido adquirida pelos meios que o Brasil inteiro passou a conhecer quando estouraram os escândalos do mensalão e do petrolão.
Se para o brasileiro defensor da vida o voto para o Legislativo sempre foi relevante, não exageramos ao afirmar que o voto para o Executivo é mais importante hoje do que já foi no passado
No entanto, o Congresso sempre foi um freio importante às pretensões petistas de legalização total ou parcial do aborto. Projetos nesse sentido existem desde logo depois da promulgação da Constituição de 1988, e mesmo no primeiro mandato de Lula, em que a base aliada era suficiente até mesmo para aprovação de emendas constitucionais, tais projetos nunca foram adiante. Isso porque até aliados de ocasião do petismo sabiam que um voto pelo aborto seria suicídio político. Essa realidade não mudou, felizmente, e há muitos motivos para imaginar que, mesmo em caso de vitória de Lula, não será o Congresso o responsável por abrir as portas ao abortismo no país.
O que mudou, no entanto, foi a compreensão de que o Poder Executivo tem muitos meios à disposição se quiser contornar o Legislativo. O petismo já tinha certa consciência disso ao usar o instrumento das normas técnicas, e o aproveitou bem em 2004 (no primeiro mandato de Lula), ao dispensar a apresentação de boletim de ocorrência para a realização de abortos na rede pública em caso de gravidez decorrente de estupro. A regra foi mantida em 2011 (no primeiro mandato de Dilma Rousseff), e toda a gritaria causada pela mais recente normativa do Ministério da Saúde, que obriga a notificação da autoridade policial, em linha com leis aprovadas nos últimos anos, demonstra que um governo abortista pode aproveitar-se de algumas brechas para ampliar o acesso ao aborto sem necessidade do Congresso.
Mas a maior diferença entre passado e presente está na possibilidade de uma “tabela” entre Executivo e Judiciário. Quando Dilma Rousseff foi cassada, em 2016, encerrando o período petista no Planalto, o Supremo Tribunal Federal já havia aprovado o aborto de anencéfalos, mas ainda estava por descobrir seus poderes praticamente ilimitados e incontestados, como o de criar crimes sem lei que os defina, a exemplo do que ocorreu com a equiparação da homofobia ao racismo, em 2019. O abortismo vem cada vez mais recorrendo ao Supremo na intenção de conseguir o que a via legislativa não lhe proporciona: já apresentou um pedido para a liberação do aborto em caso de gestantes portadoras do zika vírus e, mais recentemente, protocolou a ADPF 442, que busca legalizar o aborto em qualquer circunstância no primeiro trimestre de gestação. O próximo presidente da República nomeará pelo menos dois ministros do Supremo – um deles, em substituição a Ricardo Lewandowski, que votou contra a permissão para o aborto de anencéfalos. Com duas escolhas similares à de Luís Roberto Barroso em 2013, por exemplo, o abortismo terá passe livre no STF, a não ser que o Senado adquira uma combatividade inédita e passe a recusar nomes, o que não ocorre desde o fim do século 19.
Assim, se para o brasileiro defensor da vida o voto para o Legislativo sempre foi relevante, pela consciência de que o Congresso pode promover ou barrar o aborto, não exageramos ao afirmar que o voto para o Executivo é mais importante hoje do que já foi no passado. Buscar informação sobre o que os candidatos pensam, o que já fizeram quando estiveram no poder (seja diretamente, seja por meio de seus subordinados) e o que já disseram sobre o tema (especialmente fora do período eleitoral) é a chave para uma escolha que fará uma enorme diferença nos próximos quatro anos.
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