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editorial

As mãos sujas

A presidente Dilma Rousseff, confrontada com a dura realidade da exposição de um esquema bilionário de corrupção envolvendo seu partido, o PT, e outros da base aliada que resolveram pilhar a Petrobras, decidiu não perder uma única oportunidade de falar do assunto. Se está na posse de um ministro da Educação, fala da Petrobras. Se vai entregar residências do Minha Casa, Minha Vida, fala da Petrobras. E, quanto mais fala da Petrobras, mais demonstra não ter a mínima noção da gravidade do caso. Leviandade e irresponsabilidade seriam as duas palavras que melhor descrevem a postura de Dilma quando resolve falar da corrupção na estatal.

Na quinta-feira, dia 9, Dilma foi a Duque de Caxias (RJ) para entregar 500 casas a famílias que viviam em áreas de risco. E resolveu simplesmente decretar que o escândalo está encerrado, como se suas palavras tivessem força para apagar tudo o que o Brasil já sabe sobre o petrolão. “A Petrobras, ela limpou o que tinha de limpar, tirou aqueles que tinham de tirar lá dentro e que se aproveitaram das suas posições para enriquecer os seus próprios bolsos”, disse a presidente.

Ela quer fazer o país crer que a pilhagem da Petrobras serviu apenas para atender a interesses particulares. Talvez fosse assim no passado, como recorda o ex-gerente Pedro Barusco em seu depoimento de 10 de março à CPI da Petrobras na Câmara dos Deputados. “Iniciei a receber em 1997, 1998. Foi uma iniciativa pessoal minha junto com representante da empresa. Descrevo no meu depoimento, vou reiterar o que está dito. Na forma mais ampla, em contato com outras pessoas, de forma mais institucionalizada, isso foi a partir de 2003, 2004”, afirmou naquela ocasião, mostrando que alguma coisa mudou depois que o PT assumiu o poder: “sei que existia uma grande quantia de propina para o PT”. Barusco, é bom que se diga, não foi o único a afirmar que o petrolão abastecia partidos, e não apenas os bolsos de um ou outro achacador em benefício exclusivamente privado.

Dilma quer fazer o país crer que a pilhagem da Petrobras serviu apenas para atender a interesses particulares

E, se a Petrobras “já limpou o que tinha de limpar” e “já superou esta fase”, como disse a presidente em Duque de Caxias, por que o país ainda não sabe o tamanho da roubalheira, que parte coube exatamente a cada pessoa, a cada partido, a cada campanha eleitoral? Por que não sabemos todos os nomes, de quem pediu, de quem pagou e de quem recebeu? Ora, se o caso está encerrado como deseja a presidente, a essa hora tudo já devia estar em pratos limpos. Infelizmente não é o que acontece. A Petrobras tem tanta dificuldade em estimar o tamanho do rombo que sofreu nas mãos dos artífices do petrolão que atrasa balanço após balanço – e os números divulgados nem sempre gozam de credibilidade. Peças-chave como o tesoureiro petista João Vaccari Neto buscam habeas corpus para não ter de contar toda a verdade à CPI. Nessas condições, como afirmar que tudo está resolvido?

Ao tratar com tanta ligeireza e tantas certezas o escândalo da Petrobras, Dilma Rousseff insulta a inteligência dos brasileiros e lhes dá ainda mais razão para ir às ruas na manifestação prevista para este domingo. Afinal, é inconcebível, e sumamente grave, que a presidente da República trate de forma tão leviana o maior escândalo de corrupção destes últimos meses, fazendo pouco do esforço do Ministério Público, da Polícia Federal e do Judiciário – outra demonstração desse desprezo pelos órgãos de investigação foi a afirmação de Dilma à rede CNN, antes mesmo de ir ao Rio de Janeiro, de que tinha “certeza de que minha campanha não teve dinheiro de subornos”, ainda que outros depoimentos e delações premiadas deem conta do contrário.

Dilma encerrou seu discurso em Duque de Caxias evocando Nelson Rodrigues: “Se a seleção é a pátria de chuteiras, como dizia um saudoso fluminense, eu quero dizer que a Petrobras, de macacão, é também a pátria de macacão e mãos sujas de óleo”. Essas mãos sujas de óleo eram uma imagem adorada pelo ex-presidente Lula para fazer marketing das realizações da Petrobras. Mas há outras mãos, muito mais sujas, ainda escondidas por aí. Dilma quer nos fazer acreditar que elas se sujaram sozinhas, mas suas marcas estão sendo encontradas em locais bem inconvenientes para a presidente. Limpar tudo isso vai exigir bem mais que discursos levianos.

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