As polêmicas envolvendo o Ministério da Educação parecem não ter terminado com a troca de comando. Nesta terça-feira (30/04), o ministro Abraham Weintraub anunciou o corte de 30% do orçamento para três universidade federais: Universidade de Brasília (UnB), a Universidade Federal Fluminense (UFF) e a Universidade Federal da Bahia (UFBA). Segundo o ministro do MEC, a medida visaria “que os recursos sejam utilizados de forma mais eficaz” e o critério adotado para a escolha das três universidades seria que elas estariam promovendo manifestações partidárias inadequadas e “balbúrdia”.
Talvez o leitor já tenha visto alguma cena grotesca dentro dos campi universitários, porém o critério adotado para o corte de verbas foi extremamente vago, para não dizer absurdo. Não é possível saber se os acontecimentos aludidos pelo ministro utilizavam algum recurso público para sua realização. Também, se for o caso, se houve algum ato nas universidades que configurasse algum delito, este teria de ser apurado pela Justiça, e não ser respondido com um corte de verbas. O ministro parece não ter muita clareza sobre o que seja eficácia, doutrinação ideológica, crime, ou ainda desperdício de verbas públicas.
A forma abrupta com que a medida foi realizada não trouxe nenhuma regra de transição para que as universidades possam se adaptar à nova conjuntura
A Associação dos Docentes da UnB (ADUnB) e o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições do Ensino Superior (Andes) repudiaram com razão a medida. E o MEC foi obrigado, mais uma vez, a voltar atrás. Ou, talvez, melhor dizendo, “ir em frente”, pois o ministro decidiu então cortar os mesmos 30% do orçamento, mas de todas as universidades federais (começando a partir do segundo semestre deste ano), até que melhores critérios possam ser decididos para uma distribuição de verbas públicas baseada em índices mais objetivos.
A decisão foi tomada para que o MEC tivesse mais recursos para investir na Educação Básica, mais especificamente para as creches. Segundo o ministro, cada universitário custa em média R$ 30 mil por ano aos cofres públicos, enquanto uma criança na creche custa, para o mesmo período, em torno de R$ 3 mil. De fato, Estudos da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) indicam que o Brasil investe proporcionalmente a mesma quantia por estudante universitário que os países desenvolvidos, mas, na Educação Básica, o valor cai significativamente. Este é um quadro que o presidente Jair Bolsonaro prometeu reverter durante a campanha e o ministro estaria apenas cumprindo o esperado.
O critério isonômico adotado agora pelo MEC é certamente muito melhor que o anterior, e o governo anunciou que o corte pode ser menor conforme o país for melhorando economicamente. Entretanto, a forma abrupta com que a medida foi realizada não trouxe nenhuma regra de transição para que as universidades possam se adaptar à nova conjuntura. Sabe-se que há campi em melhor situação financeira, e outros cujo corte de verbas pode inviabilizar o funcionamento da instituição. É provável que muitos projetos de pesquisa importantes, mesmo nas áreas de engenharia, medicina, agricultura etc., que são sempre citadas pelo governo como exemplos de cursos livres de “viés ideológico”, podem ser inviabilizados com o montante de dinheiro cortado. É preciso que o MEC reveja bem esses critérios, bem como o percentual do corte, antes que a situação das universidades fique demais caótica.
Outra polêmica que apareceu um pouco antes dessa, e que é digna de nota, foi a declaração conjunta de intenções, por Bolsonaro e Weintraub, de “descentralizar” verbas públicas para os cursos de “Humanas” (ocorrida na manhã do dia 26 de abril). Na prática, seria a redução de verbas para cursos como Filosofia, Sociologia, Artes etc., para que pudessem ser empregadas em cursos mais úteis como Medicina, Engenharia, Agricultura etc. Segundo o ministro da Educação, estes últimos cursos dão retorno imediato a população.
Dada a dificuldade em escolher critérios objetivos adequados para uma simples realocação de recursos financeiros, é de se imaginar o problema que o MEC teria em encontrar um bom parâmetro para uma mudança como essa. Sem levar em conta o viés da medida abertamente positivista, aquela ideologia que prioriza as “ciências técnicas” em detrimento das “humanidades”. Para um governo que vive a alardear que é contra o “viés ideológico”, essa medida não seria coerente.
O estudo das humanidades é fundamental para a formação dos valores e critérios que orientarão o país no longo prazo. É certo que, no campo das Ciências Humanas, o Brasil se encontra em último lugar no ranking de trabalhos citados por outras publicações científicas, conforme o SCImago Journal Rank. Segundo a mesma fonte, a produção brasileira, em números absolutos, não fica muito da atrás da francesa, por exemplo, que está na metade da tabela. O que demonstra que as pesquisas efetuadas nesse campo do conhecimento no Brasil são, apesar de abundantes, irrelevantes. Esse quadro precisa ser melhorado o mais rápido possível, mas isso não se resolveria com um simples corte de orçamento, e sim com a revisão dos métodos empregados na pesquisa e nos parâmetros para a seleção das teses.
A sociedade brasileira sabe que a situação educacional do Brasil é alarmante, e espera-se muito que o MEC possa realizar um bom trabalho durante os quatro anos do novo governo. Contudo, ainda falta para a pasta mais clareza quanto aos objetivos, e mais inteligência na hora de escolher os meios a serem empregados para alcançá-los.