O governo federal decidiu estender por dois meses a ajuda emergencial de R$ 600, medida que deve manter os rendimentos de mais de 60 milhões de pessoas. O auxílio é uma necessidade diante da incerteza no controle da pandemia de Covid-19 no país, mas o passar do tempo mostra que outras ações para a manutenção de trabalho e renda serão necessárias.
O anúncio sobre o auxílio ocorreu no mesmo dia em que o IBGE divulgou os dados sobre desemprego do período entre março e maio, primeiro trimestre com dados “cheios” sobre os efeitos do coronavírus sobre o mercado de trabalho. Embora o aumento no dado final do desemprego não tenha sido exponencial – a taxa foi de 12,9% no trimestre, contra 11,6% no trimestre terminado em dezembro e 12,3% no mesmo período de 2019 – vários números mostram a profundidade sem paralelo desta crise.
Em relação ao mesmo período de 2019, 7 milhões de pessoas perderam o emprego e 10 milhões de pessoas saíram da força de trabalho. Diante da retração econômica provocada pelo fechamento parcial ou total de atividades devido ao coronavírus, milhões de pessoas deixaram até de procurar emprego. Além disso, a subutilização da mão de obra (que soma desempregados, pessoas que desistiram de procurar emprego e outras que trabalham menos do que gostariam) bateu recorde no trimestre encerrado em maio, com uma taxa de 27%, ou pouco mais de 30 milhões de brasileiros.
A abrangência que tomou o programa de renda emergencial, portanto, não deveria surpreender. Com a crise, pela primeira vez na série histórica do IBGE foi registrada no Brasil uma taxa de ocupação abaixo de 50% - em outras palavras, menos da metade das pessoas em idade para trabalhar tem alguma fonte de renda própria. O fenômeno da desocupação atingiu mais fortemente trabalhadores informais, criando um resultado contraintuitivo: mesmo na crise, a renda média do trabalho está subindo, isso porque pessoas com mais qualificação e vínculos formais tendem a demorar mais para sentirem os efeitos da depressão econômica.
Diante desses dados, parece evidente que o auxílio emergencial será insuficiente no médio prazo. Primeiramente por causa das restrições orçamentárias do governo federal que, a seu tempo, vão se impor. E também porque a ajuda de R$ 600, embora crie demanda adicional de itens básicos, não resolve sozinha os problemas que estão provocando o congelamento do mercado de trabalho.
Os dois meses adicionais de auxílio podem ser consumidos pela dificuldade em se estabelecerem protocolos claros e eficientes para o controle da Covid-19. A testagem em massa, seguida da busca de contatos da pessoa doente, está longe de ser implementada no Brasil. Tampouco há um consenso de como e quando as economias devem ser reabertas, o que pode levar a um contínuo abre-e-fecha.
O Ministério da Economia também tem sido pouco claro ao expor o que está pensando como estratégia para a manutenção e criação de empregos. A única política que parece ter sido eficiente até aqui, além do auxílio emergencial, foi a redução da jornada e suspensão de contratos de trabalho. A facilitação do crédito para pequenos e médios empreendedores está atrasada e poderá ter de passar por mais ajustes para dar fôlego às empresas. O governo também concordou em reorganizar o Bolsa Família para que ele se torne um programa de renda mínima mais abrangente, mas corre o risco de paralisar essa iniciativa com a inclusão de ideias complexas como o imposto de renda negativo. Ao mesmo tempo, um debate necessário sobre a aceleração de investimentos públicos foi cortado antes mesmo de uma análise de prós e contras.
A agenda de reformas precisa ficar clara o mais rapidamente possível. O governo tem de assumir uma postura de liderança em relação à reforma tributária, além de rediscutir rapidamente a PEC do Pacto Federativo e deixar de protelar a apresentação da reforma administrativa. Essa é uma sinalização que reduz incertezas e combina bem com ações de curto prazo – de apoio aos mais necessitados, crédito para empresas combalidas pela crise e viabilização de investimentos públicos e privados.