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Editorial

Auxílio-moradia para os juízes

Os deputados estaduais devem apreciar hoje, na Assembleia Legislativa, o projeto de lei que prevê a criação do auxílio-moradia não apenas para os desembargadores do Tribunal de Justiça (cujo presidente, Guilherme Gomes, assina o projeto de lei), como também para os demais magistrados do estado. Preocupa não apenas o próprio teor da proposta, que institui mais um dentre os já diversos privilégios de que gozam detentores de altos cargos no poder público, mas também o modo como a Assembleia pretende votar o texto, de maneira precipitada, sem a menor discussão com a sociedade.

Na justificativa anexa ao projeto de lei, argumenta-se que a proposta finalmente adequaria a situação dos magistrados ao que prevê a Lei Orgânica da Magistratura (Loman), que afirma, em seu artigo 65, que, "Além dos vencimentos, poderão ser outorgadas aos magistrados, nos termos da lei, as seguintes vantagens: (...) II - ajuda de custo, para moradia, nas localidades em que não houver residência oficial à disposição do Magistrado".

É preciso lembrar, no entanto, que a redação desse trecho da Loman foi dada por uma lei de 1986, enquanto a própria Loman é de 1979. E a Constituição Federal, que não apenas é posterior a essas duas leis como também deve preponderar sobre elas, é literal quanto à impossibilidade da adoção do auxílio-moradia. Em seu artigo 39, parágrafo 4.º, a Constituição diz que "o membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória". Em outras palavras, há motivos suficientes para entender que o auxílio-moradia pleiteado pelo Tribunal de Justiça contraria a Constituição.

Tanto é assim que o entendimento do Conselho Nacional de Justiça, expresso até o momento por meio de liminares, é de que não se deveria conceder o auxílio-moradia aos magistrados. Uma reportagem da Gazeta do Povo publicada em dezembro de 2013, quando o TJ entregou à Assembleia o projeto de lei que deve ser votado hoje, informou que o CNJ vinha determinando a suspensão do pagamento do benefício em vários estados, inclusive no Paraná, onde o Tribunal Regional do Trabalho buscava a implantação do auxílio-moradia. Entre os argumentos apresentados pelo conselheiro Emmanoel Campelo está o fato de tanto o Supremo Tribunal Federal (STF) quanto o Superior Tribunal de Justiça (STJ) estarem analisando o tema para dar uma palavra final a respeito da constitucionalidade do auxílio-moradia. Segundo Campelo, haveria o risco de os magistrados se verem obrigados a ressarcir os cofres públicos caso começassem a receber o benefício e ele viesse a ser revogado pelos tribunais superiores.

Por isso é tão preocupante que, em vez de adotar a prudência e esperar o pronunciamento final do STJ ou do STF, os deputados estaduais tenham resolvido analisar o projeto do auxílio-moradia paranaense às pressas. Um requerimento deve ser apresentado na sessão de hoje para transformar o plenário em "comissão geral", o que dispensaria a tramitação do projeto por várias comissões da Assembleia (e não apenas pela Comissão de Constituição e Justiça, que já aprovou o texto na terça-feira passada). Uma tramitação mais lenta ofereceria aos parlamentares e à sociedade a chance de discutir o auxílio-moradia por diversos pontos de vista. É legítimo que os integrantes do Judiciário exponham seus motivos aos deputados, como mostram trechos de uma carta enviada pelo presidente da Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar), Frederico Mendes Jr., e revelados pelo colunista Celso Nascimento no último domingo. Também é importante que os juízes recebam salários justos e condizentes com a importância do trabalho que exercem. Mas não é razoável excluir a sociedade desse debate. Que os parlamentares saibam agir sem precipitação, permitam aos paranaenses conhecer esse projeto e deixar clara sua opinião sobre ele, e promovam uma discussão ampla não apenas sobre a legalidade do auxílio, mas também sobre sua moralidade.

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