Falta muito pouco ou mesmo nada, a não ser as solenes formalidades de praxe para que a Venezuela do ditador Hugo Chávez seja aceita como sócia do Mercosul pelo Brasil. Só resta ao governo de Caracas, um foco de resistência a ser vencido: o Paraguai. O presidente Fernando Lugo bem que deseja a adesão, mas ainda não enviou o tema ao Congresso por não ter encontrado o "momento favorável". O aval brasileiro deve ajudá-lo nessa tarefa. O pedido de entrada da Venezuela no bloco foi aprovado pela Comissão de Relações Exteriores do Senado, por 12 votos a cinco, um resultado que retrata a forte influência de empreiteiros de obras e outros empresários nacionais com largos interesses econômicos naquele país, somada à pressão pessoal que o presidente Lula exerceu sobre senadores da base governista.
Se tivessem prevalecido critérios exclusivamente econômicos e se, ao menos, tivesse sido obedecida a consagrada liturgia internacional que rege o ingresso de novos membros a blocos econômicos, a decisão do Senado não seria discutível, contestável. Mas não foram estes fatores técnicos os seus determinantes, mas sim um mal disfarçado interesse político-ideológico de viés esquerdista alimentado pelos grupos que dão o tom da diplomacia brasileira sob o governo Lula.
Do ponto de vista das relações comerciais entre Brasil e Venezuela, o apoio brasileiro parece justificável: a Venezuela, que importa 70% de tudo quanto consome, é atualmente responsável pelo maior superávit da balança comercial brasileira. É nosso sexto maior destino comercial. Nos primeiros cinco anos de governo Lula, as exportações para o país de Hugo Chávez cresceram de 760%, saltando de US$ 600 milhões para nada menos de US$ 5 bilhões, a maior parte produtos industrializados, com elevado valor agregado e alto potencial de geração de empregos. Mais: é com a Venezuela que o Brasil consegue obter US$ 4,6 bilhões de saldo na balança comercial, 2,5 vezes superior ao obtido com os Estados Unidos.
Já do ponto de vista político, ao facilitar de tal maneira a inclusão da Venezuela, o Brasil responde positivamente à emulação de Hugo Chávez, que disputa com o presidente Lula posição de maior protagonismo nas Américas Central e do Sul. Por enquanto, pertence a Chávez a melhor marca, quer pela estridência com que desenvolve sua "diplomacia", quer pelo poder de atração que seus petrodólares exercem sobre pobres e necessitadas repúblicas do continente, a ponto de ter conseguido transformar em satélites países como a Bolívia e o Equador, para não citar o grau de dependência a que já submeteu também a outrora orgulhosa Argentina.
Assim, ao contribuir para o ingresso da Venezuela, o Brasil contribui também para o crescimento dos ímpetos hegemônicos de Hugo Chávez mentor e tutor de uma ideologia, a que deu o nome de bolivariana, que tem como proposta vanguardista o retrocesso a políticas econômicas e a comportamentos político-ideológicos há muito carcomidos pelo tempo. O populismo nacionaleiro que defende já não serve à moderna dinâmica global, à qual seria preferível os países do continente aderirem.
Na sexta-feira, um dia após a Comissão senatorial ter aprovado o ingresso da Venezuela, o presidente Lula, em visita ao país, transmitiu diretamente ao colega Chávez a boa notícia. "A melhor notícia nos foi trazida por Lula. Veio anunciando a aprovação. Daqui saúdo todos os senadores", disse ele, acrescentando que "a Venezuela, do ponto de vista moral, político, econômico e territorial é Mercosul". Aproveitou para rebater as críticas da oposição brasileira, que considera que o seu governo, além de ditatorial, contribui para "a divisão e a desintegração da América do Sul". Não, respondeu Chávez, o seu "país vive em plena democracia".
Nesse episódio o Brasil atropelou também o rito prévio que torna respeitável, confiável e forte um bloco econômico entre nações. Não seguimos o exemplo da Organização Mundial do Comércio (OMC), como lembra o embaixador Rubens Ricupero: "Em qualquer organismo baseado na ideia de concessões comerciais o país interessado em ingressar precisa pagar um preço e o preço estabelecido é a redução de suas barreiras. São negociações extremamente difíceis, que envolvem, além dos tratados coletivos, acertos bilaterais, com cada um dos membros. No caso da OMC eles chegam a 130."
A China levou 12 anos para concluir as negociações com a OMC; a Rússia luta há 19 anos com o mesmo objetivo. Enquanto isso, "o país [Venezuela] assinou um instrumento de adesão antes das negociações de redução tarifária. É algo inédito. Não conheço nada parecido em nenhum acordo comercial", reforçou o ex-ministro da Fazenda em artigo publicado na sexta-feira.
Para finalizar: uma das cláusulas constantes do Tratado do Mercosul exige de seus membros compromissos com a democracia. Hugo Chávez está à altura?
Justiça do Trabalho desafia STF e manda aplicativos contratarem trabalhadores
Parlamento da Coreia do Sul tem tumulto após votação contra lei marcial decretada pelo presidente
Correios adotam “medidas urgentes” para evitar “insolvência” após prejuízo recorde
Milei divulga ranking que mostra peso argentino como “melhor moeda do mundo” e real como a pior
Deixe sua opinião