Os procedimentos adotados pela Corregedoria Nacional de Justiça para investigar a evolução patrimonial de magistrados suspeitos de cometerem vendas de sentença ou outras ilegalidades merecem o apoio não só da sociedade, mas também, e principalmente, dos membros do Poder Judiciário. A Corregedoria, órgão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) precisa ter meios adequados e eficientes para conduzir suas investigações disciplinares, a fim de que não se transforme em órgão meramente burocrático e distanciado de sua importante atribuição fiscalizatória da magistratura. Por essa razão, não fazem sentido algumas críticas partidas de setores do próprio Judiciário, insatisfeitos com as investigações em alguns magistrados sob suspeita de enriquecimento patrimonial muito acima da realidade.
A Folha de S. Paulo publicou no dia 21 reportagem em que mostra que a Corregedoria Nacional de Justiça está elaborando um levantamento sigiloso sobre o patrimônio de 62 juízes que estão sob investigação, acusados de venda de sentenças e enriquecimento ilícito. O trabalho está sendo realizado com a colaboração da Polícia Federal, da Receita Federal, do Banco Central e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão que monitora movimentações financeiras atípicas. Esses levantamentos vêm sendo conduzidos sob sigilo e envolvem não só magistrados, mas também parentes ou pessoas que possam ser "laranjas" de juízes. As investigações buscam, assim, evitar que magistrados sob suspeita possam "disfarçar" o real alcance de seus patrimônios utilizando outras pessoas.
Esse procedimento, entretanto, vem sendo criticado por entidades de classe dos magistrados, que acusam o CNJ de abuso de poder. Há quem entenda que o CNJ estaria indo longe demais. Porém a adoção de meios complexos de investigação não caracteriza abuso de poder, nem violação legal ou constitucional. A iniciativa demonstra zelo pela eficiência investigativa. Sem o uso de meios adequados e o levantamento patrimonial com a colaboração de órgãos federais é um deles muito dificilmente o CNJ conseguirá chegar a resultados eficazes em suas investigações.
Os procedimentos adotados pelo Conselho nas investigações disciplinares não trazem risco à independência ou à imagem do Poder Judiciário, como alguns de seus membros chegam a supor. Pelo contrário, as ações devem ser encaradas como salutares, uma vez que procura preservar os sagrados princípios pelos quais a magistratura deve se nortear. Ao remover de suas funções juízes que comprovadamente cometeram atos ilegais, o CNJ só engrandece a Justiça, cuja imagem perante a sociedade deve ser preservada a qualquer custo. Sem uma atuação diligente, entretanto, o oposto também é verdadeiro. Ao se permitir a impunidade de maus juízes, o Judiciário perde, no longo prazo, a sua credibilidade.
Os procedimentos investigatórios do CNJ devem ser entendidos como mais uma razão para não se permitir o esvaziamento da competência do Conselho, como desejam entidades de classe da magistratura. A competência do CNJ para instaurar processos disciplinares contra magistrados está sendo questionada no Supremo Tribunal Federal, por associações de juízes que acreditam que o órgão estaria extrapolando sua competência e violando a independência do Judiciário. Esses argumentos são facilmente desconstruídos. Pela importância do trabalho do CNJ não se pode admitir a redução de seus poderes investigativos, o que tornaria o órgão um conselho meramente burocrático da magistratura.
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