Aquele cenário de celas inadequadas, apinhadas de gente, verdadeiras bombas prestes a explodir, pode estar perto do fim. A promessa vem da Secretaria de Estado da Justiça, que conseguiu reduzir em 40% a população que aguarda vagas nos presídios
A imagem de presos apinhados numa cela, de tão repetida, já anestesia os paranaenses. Parece se tratar de mais um dos problemas crônicos, como de resto, com os quais deveríamos nos acostumar ao lado de morros desabando e concessões à corrupção. O risco de virar rotina é, de fato, de alta probabilidade. Como já chegou a declarar o sociólogo Francisco de Oliveira, o sistema prisional é a única instituição pública mantida pelo cidadão brasileiro, mas que não lhe diz respeito. Pouco sabe do assunto e pouco lhe é dito. Por tabela, pouco pergunta, perpetuando a ignorância.
Cadeia e delegacia são vistas como questões do Estado, com as quais não devemos nos meter. O preço pago por essa cultura é alto estamos entre as nações de destaque no desrespeito aos direitos humanos nas prisões. Somos de ponta em administração do mundo do crime pelos que estão atrás das grades. Tão grave é que uma das frases de 2012 foi a do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, declarando preferir morrer a ir para uma prisão brasileira. Poderia ser repetida em coro por 190 milhões em ação.
É assunto espinhoso. Gera pigarros e engulhos. Mas volta e meia é preciso lembrar, civicamente, aonde nos levam nossos passos de cágado. Puxar pela memória que o problema monstruoso da violência passa pelas penitenciárias sucateadas. Ou pela falta delas. Um dos dados estarrecedores de 2012 é que o governo federal gastou apenas R$ 63 milhões dos R$ 312,4 milhões destinados à reforma de penitenciárias. Pelas contas, com o dinheiro que sobrou daria para erguer oito presídios. O país, lembre-se, tem 470,1 mil presos, mas 325,2 mil vagas. A conta desafia as leis da física, da matemática, do bom senso, do juízo. É sempre muito pior do que parece.
Mesmo estados sem déficit de vagas, como o Piauí, enfrentam problemas paralelos, como a falta de talheres, paredes esfarelando, instalações em petição de miséria, confirmando a prisão brasileira como um legítimo retrato das mais exageradas ficções. Papillon, assim como o ministro, não suportaria tanto. A estimativa é de todas as unidades da federação se acotovelarem para saber quem é a verdadeira "Rainha da Sucata" em se tratando de cadeias, e quem já deixou a maior contribuição à história da violência das prisões. Vale dizer que o Paraná, em levantamentos anteriores, estava entre os piores colocados.
Em meio a esse cenário, uma boa notícia, publicada quinta-feira passada nesta Gazeta do Povo. Nos dois últimos anos, o governo do estado conseguiu reduzir em 40% o número de presos em delegacias. Foram transferidos para espaços adequados. É quase metade da bomba desarmada eram 16,2 mil presos; sobraram 9,1 mil à espera de tratamento adequado: eles ainda dormem na delegacia. O interior, em particular, ressente de medidas, é verdade, mas nada que tire o brilho da notícia a melhor dos últimos tempos em se tratando do sistema prisional no Paraná.
As delegacias funcionam como escoadouro das cadeias. São sempre o pior remendo para o soneto. Impossível esquecer as descrições que os presos dão dos pequenos espaços divididos por multidões. Cheiros insuportáveis, três camas para 30 pessoas, hierarquias absurdas, ditando quem manda e quem obedece. Tão absurdo quanto é deduzir que o estágio a que se chegou é resultado do descaso geral da nação com o assunto, fazendo crescer o obscurantismo em torno das matrizes da violência.
São variações para o tema, é verdade. Se a palavra de ordem for olhar para a frente, a palavra certa é mirar no exemplo dado pela secretária de Estado da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos, Maria Teresa Uille Gomes. Ela agarrou esse touro à unha e seus esforços merecem continuidade. Sim, porque a redução de 40% deixa ainda 60% por vir. Faltam 5.634 vagas para sanar o déficit, como informa a reportagem, extirpando de vez a prática ilegal de prender nas delegacias e não em unidades prisionais ou em centros de triagem.
Em paralelo às delegacias sendo usadas para o que de fato se destinam, devem ser impulsionados outros processos, capazes de reabilitar. E, o mais difícil, devolver a credibilidade ao sistema prisional. De acordo com a secretária de Justiça, serão erguidos 14 presídios no Paraná até o fim de 2014. Fogos. Que esses projetos andem de braço dado com a sociedade organizada. Não é impossível as boas novas que agora recebemos de presente são uma prova disso.
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