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Editorial

Bolsonaro, Bebianno e uma distração desnecessária

 | Mauro Pimentel/AFP
(Foto: Mauro Pimentel/AFP)

Enquanto terminava seu período de recuperação após uma cirurgia, e às vésperas de entregar dois projetos cruciais que podem ser o primeiro legado de seu governo – a reforma da Previdência e os projetos anticrime –, o presidente Jair Bolsonaro teve de lidar com um outro problema: o seu ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, exonerado nesta segunda-feira. Todo o episódio envolvendo o ministro, no entanto, poderia ter sido resolvido de maneira muito mais serena, mostrando que o processo de aprendizado dos novos ocupantes do Planalto ainda está em curso, mas precisa estar terminado logo, já que batalhas muito maiores se aproximam.

A controvérsia que levou à queda de Bebianno começou no início do mês, quando duas reportagens do jornal Folha de S.Paulo apontaram para situações envolvendo supostas candidatas laranjas, lançadas apenas para cumprir regras de repasse do Fundo Partidário – aliás, mais um argumento para o fim deste absurdo, ao lado do megafundo eleitoral – em Minas Gerais e Pernambuco. Uma dessas candidatas, que não passou dos 300 votos, recebeu R$ 400 mil em recursos públicos repassados ao PSL, mais que vários outros candidatos da legenda, incluindo deputados eleitos com votações expressivas. Naquela época, Bebianno era o presidente do PSL – ele foi o responsável pela ida de Bolsonaro para o partido e trabalhou como seu coordenador de campanha.

Os filhos do presidente não podem ter passe livre para fazer o que bem entenderem, inclusive fritar ministros em público

Mas a relação entre presidente e ministro só azedou dias depois das reportagens. Bebianno disse ao jornal O Globo que não havia crise nenhuma dentro do governo, e que tinha conversado com Bolsonaro três vezes no dia 12 de fevereiro, quando o presidente ainda estava internado em São Paulo. Um dos filhos de Bolsonaro, Carlos, que é vereador no Rio de Janeiro, usou o Twitter para afirmar que Bebianno havia mentido, e que ministro e presidente não tinham conversado sobre o escândalo do laranjal. A divulgação de áudios de conversas entre ministro e presidente, ocorrida nesta terça-feira, já depois da exoneração, mostrou que ambos tinham razão: como Bebianno havia alegado, ele havia, sim, falado com o presidente; como Carlos havia dito, o caso dos laranjas não estava entre os temas tratados. Os áudios mostram outros motivos de desavença, como o cancelamento de uma viagem de ministros à Amazônia e uma reunião marcada por Bebianno com um executivo da TV Globo.

Ainda que Carlos tenha publicado suas mensagens no Twitter em uma tentativa de impedir que o escândalo do laranjal acabasse caindo no colo de Bolsonaro, a interferência do filho, feita publicamente, de forma açodada e desnecessária, criou uma saia justa para o presidente. O equívoco de Bolsonaro foi ter tomado partido publicamente em favor do filho, retuitando as mensagens de Carlos na noite do dia 13, quando já havia recebido alta, em vez de chamar todas as partes envolvidas para uma conversa franca, mas reservada. Isso queimou os navios e criou uma situação praticamente sem retorno, que teve seu desfecho na segunda-feira, com o anúncio da exoneração e a divulgação, pelo Planalto, de um vídeo em que Bolsonaro usa termos amistosos e até bastante elogiosos para se referir a Bebianno.

Com o caso Bebianno encerrado – ao menos, é o que se espera –, ficam algumas perguntas. Uma delas trata de questão antiga, mas ainda não resolvida: o papel e a influência dos filhos de Bolsonaro no governo. Agora que o presidente deixou o hospital, e à medida que sua saúde vai melhorando, esperamos que ele retome o protagonismo e deixe claro aos filhos que eles não têm passe livre para fazer o que bem entendem (muito menos fritar ministros em público), e não podem criar obstáculos e distrações ao governo com suas atitudes. Outro fio solto está no caso propriamente dito dos laranjas. Ainda que as denúncias tenham sido relegadas a um papel secundário na queda de Bebianno, elas atingem em cheio outro ministro, o do Turismo, que segue confortável no cargo. Marcelo Álvaro Antônio era o presidente do diretório mineiro do PSL em 2018 e, por isso, era o responsável pelos repasses do Fundo Partidário em Minas Gerais.

Em poucos dias, o governo precisará concentrar suas forças para levar adiante algumas das plataformas para as quais foi eleito: a saúde fiscal do país e o combate à criminalidade. É nisso que Bolsonaro precisa se empenhar agora, com uma liderança que corresponda às expectativas que os brasileiros manifestaram quando lhe deram seu voto. Que seu entorno não continue a lhe criar empecilhos.

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