Jair Bolsonaro participou, nesta quinta-feira, da Cúpula dos Líderes sobre o Clima, evento organizado pelo presidente norte-americano, Joe Biden, e repetiu alguns temas caros ao governo brasileiro em temas ambientais, como o papel do agronegócio. No entanto, o discurso também chamou a atenção por algumas promessas auspiciosas, que, se concretizadas, efetivamente darão ao Brasil um novo papel no cenário ambiental global.
Para além de eventuais imprecisões nos números citados por Bolsonaro – especialistas já apontaram, por exemplo, que o Brasil responde por 4% a 5% da emissão global de gases de efeito estufa, e não 3% –, é verdade, por exemplo, que nossa matriz energética já está entre as mais limpas do planeta, deixando para trás muitos países desenvolvidos que hoje são críticos à política ambiental brasileira. Mas isso não é suficiente, especialmente diante da persistência dos crimes ambientais, como o desmatamento na Amazônia e no Pantanal, uma chaga histórica que tem colocado o atual governo brasileiro na defensiva desde seu primeiro ano. O Brasil não pode, portanto, usar seus pontos fortes para escamotear a necessidade de respostas firmes à comunidade internacional.
Se o Brasil quer fazer jus à ajuda estrangeira, terá de mostrar muito mais serviço, pois a percepção internacional é de que a atual gestão não tem feito o suficiente para coibir as agressões ao meio ambiente
Nesse sentido, Bolsonaro prometeu eliminar o desmatamento ilegal até 2030, “com a plena e pronta aplicação do nosso Código Florestal”, acrescentando ter determinado “o fortalecimento dos órgãos ambientais, duplicando os recursos destinados às ações de fiscalização”. É justamente nesta prometida duplicação que o governo ainda precisa efetivamente demonstrar que a ação corresponderá à intenção, pois o cenário é de aperto orçamentário total e de brigas políticas em torno da sanção de um Orçamento da União que já exigirá truques contábeis para que não se descumpra nenhuma regra de responsabilidade fiscal. O texto aprovado pelo Congresso recentemente prevê R$ 2,5 bilhões para o Ministério do Meio Ambiente – embora o valor seja maior que o previsto incialmente na Lei de Diretrizes Orçamentárias, ainda é ligeiramente inferior ao montante de 2020.
Além disso, Bolsonaro ainda adiantou em dez anos o prazo para o país atingir a neutralidade nas emissões de carbono, de 2060 para 2050. Ainda que um discurso breve em um fórum internacional não ofereça a chance para se detalhar como esse objetivo será atingido – e como o Brasil conseguirá fazê-lo em tempo ainda menor que o originalmente previsto –, o governo passa a dever um plano concreto de ação para que a meta seja alcançada, com políticas de Estado que transcendam a sucessão de governos, já que se trata de plataforma que será implantada ao longo de décadas. O mesmo tipo de detalhamento se espera, justiça seja feita, dos diversos outros países – alguns deles, poluidores em escala muito maior que o Brasil – que, nesta mesma quinta-feira, também apresentaram suas promessas de redução na emissão de gases de efeito estufa, algumas delas até mais ambiciosas que a proposta brasileira.
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Em agosto de 2019, Bolsonaro respondeu à suspensão da ajuda alemã ao Fundo Amazônia com um “pode fazer bom uso dessa grana. O Brasil não precisa disso”. Agora, em seu discurso, o presidente ressaltou a importância dos recursos internacionais. Mas, se o Brasil quer fazer jus à ajuda estrangeira, terá de mostrar muito mais serviço, pois a percepção internacional é de que a atual gestão não tem feito o suficiente para coibir as agressões ao meio ambiente. E, por mais que haja outros tipos de interesse na crítica feita ao Brasil – caso, por exemplo, do presidente francês Emmanuel Macron, que usa o meio ambiente para atacar o acordo comercial entre Mercosul e União Europeia, mas quer, na verdade, proteger seu agronegócio fortemente subsidiado –, fato é que o Brasil tem, sim, falhado na defesa de seu patrimônio ambiental.
A preservação do meio ambiente é um imperativo que transcende posições ideológicas. Não falamos de um imobilismo que condene à pobreza perpétua as populações das áreas preservadas, mas da busca por soluções que gerem riqueza por meio da exploração de atividades ambientalmente sustentáveis, como o turismo. Mesmo o agronegócio, frequentemente – e injustamente – retratado como adversário da preservação ambiental, reconhece que as deficiências brasileiras na preservação custam caro ao setor, que vê portas fechadas no mercado internacional. Mas apenas boas intenções e discursos não bastam para que o Brasil seja visto como líder mundial no cuidado com o meio ambiente: isso, só a ação firme poderá conseguir.
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