Nos primeiros dias de novembro, entre as polêmicas em torno da montagem da equipe e das medidas a serem tomadas pelo novo governo, o presidente eleito Jair Bolsonaro emitiu declarações que provocaram polêmicas sobre a questão do desemprego. Em uma fala, ele reclamou dos dados e da metodologia no cálculo dos desempregados; em outra, afirmou que se fala muito em direitos no Brasil, mas não há empregos e que o desafio é destravar a economia para crescer e gerar empregos. O assunto é relevante, a polêmica é boa, o debate é necessário e soluções precisam vir com urgência, pois o desemprego é, hoje, o maior flagelo econômico e social nacional.
Para situar a questão, segundo o IBGE, o Brasil terminará o ano com 208,5 milhões de habitantes, dos quais 104 milhões em condições de trabalhar. Desses, há 13 milhões no conjunto do setor estatal, onde não há desemprego nem demissões, enquanto outros 91 milhões são trabalhadores à disposição do setor privado. Deste total, 12,7 milhões estão desempregados, 5 milhões estão subempregados em jornadas inferiores a 40 horas por semana e 4,8 milhões desistiram de procurar emprego – são os que o IBGE chama de “desalentados”. A soma dessas categorias configura um gigantesco desperdício de força de trabalho. Vale mencionar que, dos 91 milhões de potenciais trabalhadores do setor privado, não mais que 36 milhões têm, atualmente, carteira profissional assinada.
O novo governo herdará um quadro econômico muito ruim
Esse é o quadro geral no qual se inserem o brutal desemprego e o bilionário déficit das contas do INSS. Trabalhador desempregado não contribui com o INSS e aumenta a demanda por benefícios sociais como Bolsa Família e seguro-desemprego. Diante dessa realidade dramática e preocupante, a fala do presidente eleito revela uma realidade dura e triste: efetivamente as leis oferecem direitos, mas poucos são os garantidos, sobretudo porque há trabalhadores autônomos, empresários, microempreendedores e outros fazendo trabalhos esporádicos por conta própria – isto é, trabalhadores fora do grupo de 36 milhões com carteira assinada e, logo, sem a proteção da legislação trabalhista.
Não se trata de retirar benefícios, principalmente os de natureza financeira – quem diz que isso é necessário para a retomada do emprego está apelando a uma falsa dicotomia. Mas, de fato, trata-se de dar prioridade ao aumento do número de trabalhadores com renda e à redução das elevadas taxas de desemprego e subemprego. Há momentos graves na história das nações em que as escolhas são doloridas. Isso ocorre em especial após períodos de grave recessão econômica, como a que ocorreu no Brasil. Nunca é demais lembrar que o PIB caiu 3,5% em 2015 e mais 3,5% em 2016, enquanto a população seguia aumentando em torno de 1,5 milhão de habitantes por ano. A modesta recuperação iniciada em 2017, com crescimento do PIB de 1% e prosseguida em 2018 com expansão não superior a 1,5%, está longe de ser capaz de reduzir significativamente o grave desemprego.
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O novo governo herdará um quadro econômico muito ruim, em que os três problemas mais graves são o desemprego, os déficits nas contas públicas e o rombo dos dois sistemas de Previdência Social, o INSS e o sistema dos servidores públicos nas três esferas da Federação. É bem verdade que eventual crescimento do PIB em 2019 na casa dos 3%, se ocorrer, terá capacidade de amenizar o drama dos municípios, dos estados e da União, pelo aumento da arrecadação tributária resultante de um produto nacional maior. Mas esse efeito positivo não é suficiente para reduzir de forma expressiva a gravidade das contas públicas, nem para superar os defeitos estruturais dos três problemas citados.
Não haverá vida fácil para o novo governo, e nem a sociedade pode esperar melhorias fantásticas nas graves questões do país. Entretanto, é preciso começar o tratamento não para curar as deficiências, mas para começar a reduzir o quadro de enfermidade econômica por que passa o país, a começar pelo desequilíbrio financeiro do governo. Neste fim de ano já começou a revoada de governadores rumo a Brasília na busca de ajuda do governo federal para evitar a implosão das finanças estaduais. O governo federal já emitiu sinais de que eventual ajuda estará condicionada a que os estados façam reformas na previdência de seus servidores, mesmo porque as mudanças já feitas na previdência dos servidores federais desde 2003 não foram imitadas pela maioria dos estados, apesar dos avisos do Ministério da Fazenda aos governadores: ou faziam suas reformas ou, em pouco tempo, o equilíbrio financeiro das contas iria explodir, como ocorreu no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul, por exemplo. Nesse contexto, a fala do novo presidente sobre a necessidade de criar empregos como sendo a prioridade maior da questão trabalhista não tem nada de despropositado.