Se o presidente argentino, Mauricio Macri, não veio à posse de Jair Bolsonaro em 1.º de janeiro, estando em férias na Patagônia – o representante argentino foi o chanceler Jorge Faurie –, ele fez questão de ser o primeiro chefe de Estado a fazer visita oficial ao brasileiro, ocorrida nesta quarta-feira. Um bom entendimento entre Brasil e Argentina é crucial para o desenvolvimento dos dois países e para o futuro do Mercosul, e Bolsonaro e Macri demonstraram a intenção de caminhar neste sentido.
O Mercosul nasceu, quase três décadas atrás, com o objetivo de incentivar a cooperação econômica e o comércio entre seus membros originais – Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. No entanto, com a ascensão de governos de esquerda no continente no início do século 21, o bloco foi totalmente desvirtuado, tornando-se um clubinho ideológico afundado no protecionismo e refratário a quaisquer conversas sobre livre comércio, especialmente com os Estados Unidos. O compromisso do Mercosul com a democracia no continente sul-americano morreu quando, em uma manobra de Dilma Rousseff, Cristina Kirchner e Pepe Mujica, o Paraguai foi suspenso do bloco devido ao impeachment-relâmpago de Fernando Lugo, abrindo espaço para que a Venezuela chavista entrasse no grupo, algo a que o novo governo paraguaio se opunha.
Uma maior inserção internacional brasileira, objetivo declarado da equipe econômica e diplomática, passa pelo Mercosul
Felizmente, os novos ventos que sopraram no continente nos últimos anos, especialmente com a queda dos governantes de esquerda no Brasil e na Argentina, permitem crer em um ressurgimento da vocação original do Mercosul. A Venezuela, que jamais deveria ter entrado no bloco, está suspensa pelas sucessivas violações à cláusula democrática. O Mercosul voltou a negociar com empenho um acordo comercial com a União Europeia, e também busca estreitar os laços com a Aliança do Pacífico, bloco formado por México, Chile, Colômbia e Peru e que, em bem menos tempo que o Mercosul, já conseguiu muito mais avanços na área comercial.
Bolsonaro e Macri mostraram a intenção de flexibilizar as regras do bloco – o Mercosul é uma união aduaneira, e por isso negociações comerciais precisam necessariamente envolver todos os membros – para que cada país tenha mais liberdade de assinar acordos comerciais isoladamente, se assim o desejar. Não se trata de enfraquecer o Mercosul, até porque ninguém ignora que a atuação em bloco continuará dando ao quarteto muito mais musculatura quando se tratar de negociar acordos com os grandes players do comércio mundial ou em fóruns multilaterais como a Organização Mundial do Comércio, mas de reconhecer as peculiaridades de cada país e até mesmo impedir que a ascensão de um governo mais avesso à abertura comercial em algum dos membros acabe engessando todo o bloco, como Cristina Kirchner fez no passado.
Por mais que, ainda antes da posse de Bolsonaro, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tenha minimizado a importância do Mercosul, alcançar a maior inserção internacional brasileira, um objetivo declarado da equipe econômica e diplomática, passa pelo bloco. Não pela caricatura em que ele foi transformado por governos de esquerda sul-americanos, mas por um Mercosul robusto, um mercado consumidor de cerca de 250 milhões de habitantes, uma potência agrícola, mas cujo leque de produtos é muito mais amplo. O Brasil só tem a ganhar se o Mercosul incentivar o comércio dentro do bloco e buscar ativamente novos parceiros em todo o mundo.