A estreia do novo presidente argentino, Mauricio Macri, na Cúpula do Mercosul não poderia ter sido melhor. “Não pode haver lugar a perseguição ideológica e a privação ilegítima por pensar diferente”, disparou na segunda-feira, pedindo ao governo venezuelano a libertação dos presos políticos, como os líderes oposicionistas Leopoldo López e Antonio Ledezma. Essa e outras das primeiras atitudes de Macri mostram sua disposição de devolver seu país à normalidade institucional após os 12 anos de dominação do kirchnerismo – um caminho que certamente será longo, mas começa bem.
Empresário e administrador público, ex-prefeito de Buenos Aires, Macri já assinou inúmeros atos desde a sua posse, no último dia 10, que sinalizam seu esforço para criar um novo e saudável ambiente político, social e econômico no país vizinho. Destroçada pelo populismo peronista e pelo desrespeito às mais elementares normas do livre mercado e às liberdades democráticas, a Argentina aprofundou nos anos Kirchner seu naufrágio em direção ao empobrecimento, à desorganização da economia e ao descrédito internacional. Nas eleições de novembro, Macri venceu as forças do atraso e agora lhe compete vencer os desafios da reconstrução nacional e da reinserção do país no mundo globalizado.
O Mercosul finalmente ganha um integrante de peso disposto a confrontar o autoritarismo chavista
Dois de seus primeiros decretos buscam recompor a força econômica da Argentina e, ao mesmo tempo, contribuem para o fortalecimento do Mercosul e para a retomada das relações com o Brasil com a intensidade que um dia já teve e com os benefícios mútuos que já propiciou. O primeiro deles reduz impostos de exportação de soja e isenta as exportações de trigo, milho e carne bovina, produtos que tradicionalmente compunham a lucrativa cesta de produtos agropecuários que a Argentina comercializava com o mundo. Foi de Cristina Kirchner a iniciativa de taxar – na verdade, confiscar parte dos valores em dólar – estes produtos na vã esperança de recuperar os depauperados cofres do país.
Em outro ato, Macri aboliu absurdas restrições impostas à importação de produtos. Os argentinos estavam proibidos de comprar produtos no exterior em valores superiores a US$ 50, sob pena de serem incluídos na categoria de importadores e, consequentemente, serem obrigados a pagar taxas absurdas.
Foi por causa de decisões protecionistas como esta que o comércio de veículos e peças, assim como de eletrodomésticos, entre Brasil e Argentina ficou praticamente inviabilizado. Cerca de 18 mil produtos, incluindo os de origem agropecuária, foram incluídos na lista de restrições. Bilhões de dólares deixaram de abastecer a economia dos dois países e, de igual modo, também as economias dos demais países-membros do Mercosul.
No campo institucional, é de se louvar a intenção, anunciada pelo novo ministro das Comunicações, Oscar Aguad, de rever a Lei de Meios, um instrumento da era Kirchner criado sob medida para atingir e enfraquecer os grupos de comunicação que não se inclinaram diante do governo. Será uma vitória da liberdade de imprensa na América do Sul.
E, na área internacional, o Mercosul finalmente ganha um integrante de peso disposto a confrontar o autoritarismo chavista. A Argentina faz o que o Brasil deveria fazer, mas não faz por simpatizar com o chavismo. Cristina Kirchner tinha ajudado a transformar o Mercosul: de organismo facilitador do comércio entre seus membros, ele virou um clube ideológico sem escrúpulos, como ficou evidente no episódio em que o Paraguai foi suspenso justamente para permitir o acesso da Venezuela. Macri deixa claro que não será cúmplice de atentados à democracia dentro do bloco.
A Argentina começa a viver novos tempos. Que seja uma inspiração para o Brasil.