Embora ainda seja cedo para se afirmar com certeza que houve um “descolamento” da economia, há sinais de que os efeitos das denúncias contra o presidente Michel Temer não devem impedir a saída da recessão. Uma das razões para o impacto relativamente baixo da crise política está no comércio exterior. As exportações chegaram a US$ 107 bilhões no primeiro semestre, um crescimento de 19,3% na comparação com o primeiro semestre do ano passado.
Esse crescimento foi resultado de uma combinação de safra recorde, recuperação no preço do minério de ferro e retorno de alguns setores industriais a mercados que haviam sido perdidos nos momentos de real mais valorizado. A indústria automotiva, por exemplo, tem conseguido aumentar a produção por causa das exportações, contornando assim a apatia do mercado interno. Como benefício direto, o aumento das exportações fez a balança comercial ter um superávit recorde no primeiro semestre, de US$ 36 bilhões – resultado que ajuda o país a absorver possíveis choques cambiais.
Mais impressionante do que o desempenho do comércio exterior é o fato de ele ocorrer apesar da pouca integração do Brasil ao resto do mundo. Nesta semana, o país passa pela avaliação feita regularmente pela Organização Mundial do Comércio e o diagnóstico é de que pouca coisa evoluiu nas relações comerciais no período de 2013 a 2016.
O Brasil é apontado pela Câmara de Comércio Internacional como o mais protecionista do G20, grupo que reúne as 20 maiores economias do mundo. O relatório de avaliação da OMC detalha essa baixa integração – ela é resultado de uma combinação de tarifas altas, sistema tributário complexo, política industrial ineficiente, uso de medidas protecionistas em larga escala e manutenção de setores protegidos.
O efeito dessa combinação de políticas é uma baixa competitividade no mercado internacional que, quando combinada com a pouca agilidade na negociação de acordos bilaterais e multilaterais, torna o Brasil relativamente fechado. “A economia brasileira permanece orientada para dentro, com o fluxo de comércio agregado de produtos e serviços representando 25% do PIB durante o período de revisão”, aponta o relatório da OMC. Esse é um dos menores índices de corrente de comércio do mundo.
O protecionismo é ainda comum a diversos setores. Há indústrias fechadas ao investimento estrangeiro – transporte aéreo, serviços financeiros, de saúde, agronegócio, mídia e mineração -, e dezenas de outras que conseguiram proteção por meio de medidas antidumping. No período analisado pela OMC, o Brasil instituiu 123 novas medidas e, em dezembro de 2016, 163 estavam em vigor. Essas medidas têm o objetivo de estabelecer tarifas extraordinárias para importações consideradas “desleais” pelo governo brasileiro, mas se tornaram uma forma recorrente de proteção por prazos bastante longos.
O relatório deixa muito claro que os desafios para o Brasil são muito complexos porque combinam o fechamento do mercado com os anacronismos de suas escolhas econômicas internas. O sistema tributário é complicado e consome recursos das empresas, reduzindo sua competitividade. O Estado ainda tem um peso enorme em diversos setores, como petróleo, mineração e agricultura. E os ganhos de produtividade, que viriam com a combinação de treinamento da mão de obra e investimento em tecnologia, ocorrem em um ritmo decepcionante.
Essa complexidade não significa que o país deva continuar orientando sua estratégia econômica para dentro. O comércio é um dos caminhos para estimular o aumento da produção e da produtividade, e precisa fazer parte das escolhas que o Brasil fará nos próximos anos. A maior abertura pode ser adotada em novos acordos comerciais, como o que está em negociação com a União Europeia, ou de forma isolada. A escolha de manter inalteradas as tarifas de importação e impor a burocracia para a entrada da maioria dos produtos pode ser revertida de unilateralmente. Feita de forma gradual e organizada, a maior integração ao mundo vai se transformar em maior riqueza para os brasileiros.
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