Para quem vem acompanhando os números do mercado de trabalho como sinal de uma possível recuperação econômica após a devastação causada pela pandemia de Covid-19, a quarta-feira trouxe números bons e ruins. O Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério da Economia, mostrou a abertura de 414,5 mil postos de trabalho com carteira assinada em novembro. É o melhor número para o ano, após os 394,5 mil de outubro, e ainda trouxe o acumulado do ano para o campo positivo – o saldo de 2020 é, agora, de 227 mil vagas formais abertas, com mais contratações que demissões.
O ministro Paulo Guedes comemorou o número, mas, embora o país inteiro espere que ele tenha razão quando afirma que o Brasil poderia fechar o ano com saldo positivo na criação de empregos formais, os dados de dezembro ainda podem fazer de 2020 um ano com mais demissões que contratações. Mesmo quando a economia está crescendo, o último mês do ano costuma ser marcado pelos desligamentos daqueles que foram contratados para atender à demanda maior das festas de fim de ano, e o próprio Ministério da Economia lembra que os bons números de novembro também foram puxados pelas vagas temporárias. Nos últimos 15 anos, o melhor dezembro foi o de 2019, e ainda assim houve 307 mil demissões a mais que contratações; seria necessário um desempenho extraordinário para impedir que os dados de 2020 voltem para o campo negativo.
Na Pnad Covid-19 referente a novembro, a população ocupada foi de 84,7 milhões de brasileiros, número bastante distante do recorde de 94,6 milhões registrado no fim de 2019
Há um fator que pode influenciar o resultado deste mês (e, consequentemente, de 2020 como um todo) no Caged: o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda (BEm), criado pelo governo federal logo no início da pandemia de Covid-19 e que permitiu a redução proporcional de jornada e salário, ou a suspensão temporária do contrato de trabalho. Para compensar a diminuição da renda dos trabalhadores nesses meses, o BEm determinou que eles teriam estabilidade igual à duração da redução de salário ou suspensão do contrato; dadas as sucessivas prorrogações do BEm (e o governo já estuda uma nova extensão para 2021), ainda há muitos brasileiros que estão nesta situação de estabilidade. Na melhor das hipóteses, a economia estará mais aquecida quando esse prazo expirar e os trabalhadores serão mantidos; do contrário, a onda de desligamentos terá sido apenas adiada.
Independentemente dos números positivos ou negativos, o Caged tem uma limitação ao contemplar apenas o mercado de trabalho formal, com carteira assinada, deixando de fora toda uma multidão de autônomos, informais e subempregados. Por isso também é preciso olhar outros indicadores, e eles não são nada animadores. Também nesta quarta-feira o IBGE divulgou a taxa de desemprego para novembro segundo a Pnad Covid-19: 14,2%, um novo recorde. Foram 14 milhões de desempregados registrados no mês passado, contra 10 milhões em maio, quando a pesquisa começou a ser realizada. Mas também este índice tem suas nuances, por exemplo quando considera desempregados apenas aqueles que estão à procura de trabalho, usando ainda outras categorias, como a dos desalentados, para descrever pessoas que nem chegaram a buscar emprego. Assim, seria possível até mesmo que o índice de desemprego se mantivesse estável ou crescesse ainda que a economia estivesse reagindo – bastaria que muitos desalentados, por vários motivos, voltassem a procurar oportunidades em ritmo maior que o da absorção de desempregados pelo mercado de trabalho.
Por isso, há especialistas considerando que o indicador mais fiel à realidade do mercado de trabalho, sem distorções ou defasagens, é a população ocupada. Na Pnad Covid-19 referente a novembro, este número foi de 84,7 milhões de brasileiros, ou 49,6% da população com idade para trabalhar. Ainda é um número muito baixo, equivalente à população ocupada de meados da década passada, e bastante distante do recorde de 94,6 milhões registrado no fim de 2019, o que dá uma ideia mais precisa do tamanho do desafio que o país tem à frente no campo do emprego.
A incerteza ainda rondará o Brasil por pelo menos alguns meses. O país não será capaz de vacinar parte significativa da população no primeiro semestre de 2021, e convive com um recrudescimento da curva de contágio do coronavírus que está sendo respondida por autoridades com novas rodadas de restrições que afetam a economia. Também no início do ano que vem já não haverá mais a possibilidade do auxílio emergencial, pago a dezenas de milhões de brasileiros desde o início da pandemia. Preservar negócios e empregos continuará sendo prioridade absoluta neste início de 2021.