Com pelo menos um ano de atraso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reconheceu com alguma clareza a existência da crise que afeta o setor agrícola brasileiro. Infelizmente, não demonstrou ter conhecimento de sua profundidade e extensão e, muito menos, apontou os caminhos que seu governo adotará daqui por diante para evitar o desastre de uma repetição.
"Nós temos que aproveitar, no momento em que a agricultura se recupera, para que a gente possa estabelecer todas as políticas agrícolas necessárias para que numa próxima crise a gente não seja pego de calça curta como nós fomos pegos nessa crise agora, quando muita gente deixou de produzir, quando a indústria de máquinas deixou de vender e muitos trabalhadores foram mandados embora", disse Lula ao inaugurar um trecho de estrada em Mato Grosso, na última terça-feira.
As condições essenciais para a reprodução do mesmo quadro crítico continuam postas e o governo ainda se mantém de "calça curta", para usar a mesma peculiar linguagem do presidente. Seu diagnóstico quanto aos efeitos da quase insolvência do setor chegou muito próximo da exatidão, mas foi muito superficial e demasiadamente genérico o ensaio que fez em relação às soluções que o setor espera.
De fato, como disse Lula, deve-se à desvalorização do dólar e aos problemas climáticos boa parte da crise que desestruturou o agronegócio nos dois últimos anos. O setor vinha mostrando toda a sua força econômica e seu potencial de contribuição ao desenvolvimento nacional quando a seca que atingiu o Sul maior região produtora do país derrubou a produção, ao mesmo tempo em que a política cambial sobrevalorizou o real e caíram os preços internacionais das nossas principais commodities.
Graças a essa conjunção de fatores, cresceu a inadimplência dos produtores rurais e diminuiu o emprego de tecnologias na produção agropecuária, favorecendo a explosão da cadeia de infortúnios referida pelo próprio presidente, representada pela queda vertiginosa do desempenho da indústria de máquinas e implementos, pelo corte de milhares de empregos, pelo abandono de áreas produtivas, culminando com o empobrecimento do interior dependente da economia agrícola. Evidentemente, reflexos foram sentidos na arrecadação de impostos assim como o PIB cresceu menos do que podia. Ainda assim, o grito dos agricultores, mesmo no auge da crise, foi pouco ouvido em Brasília.
Felizmente, o movimento ainda não consolidado de recuperação dos preços internacionais e o bom comportamento do clima no início da nova safra indicam para a possibilidade de uma recomposição parcial das perdas. Mas persistem fatores que fizeram eclodir a crise um deles de modo particular, isto é, a atual política cambial, responsável pela perda de competitividade dos produtos brasileiros no mercado mundial e da lucratividade do setor agrícola sem o que não há chance de sustentação do processo de recuperação.
Os primeiros quatro anos do governo Lula foram marcados pela inexistência de uma política agrícola que garantisse segurança mínima aos produtores, a exemplo do que se dá mundo afora. Espera-se que os próximos quatro anos sirvam para a necessária correção do rumo, conforme a promessa feita agora pelo presidente.