| Foto: Antônio More/Gazeta do Povo

Na terça-feira passada, 19 de dezembro, a Câmara dos Deputados aprovou um acordo de céus abertos assinado seis anos atrás entre os presidentes Barack Obama e Dilma Rousseff. O texto retira os limites para a oferta de voos entre Brasil e Estados Unidos – pelas regras atuais, há um limite de 301 voos por semana em cada direção, que ainda não chegou a ser atingido: segundo dados da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), em maio deste ano as empresas brasileiras tinham 59 voos semanais para os Estados Unidos, e as norte-americanas operavam 137 frequências para o Brasil.

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A medida não é unânime entre as empresas aéreas brasileiras que voam para os Estados Unidos: Gol e Latam foram favoráveis, mas a Azul se opôs à aprovação do acordo. O presidente da companhia, John Rodgerson, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, levantou diversos pontos que, embora bastante razoáveis, não parecem suficientes para invalidar o acordo de céus abertos.

Apesar de todas as riquezas naturais e culturais do país, o Brasil está muito longe dos líderes mundiais em turismo

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É fato que as empresas brasileiras, na comparação com suas concorrentes norte-americanas, têm uma série de dificuldades para operar, seja tributárias, seja trabalhistas, seja de custo dos insumos, especialmente dos combustíveis. Mas, assim como na já conhecida disputa entre taxistas e motoristas de aplicativos como Uber e Cabify, a solução não passa por fechar a porta à concorrência, e sim pela pressão para que as amarras excessivas existentes sobre um dos lados – no caso, os taxistas e as empresas aéreas nacionais – sejam removidas para que esses atores possam competir em melhores condições sem que o usuário seja prejudicado por uma reserva de mercado.

Mesmo assim, Rodgerson coloca o dedo em uma ferida dolorida: o Brasil está muito aquém de seu potencial turístico, e não é uma política de céus abertos que resolverá esse problema. Apesar de todas as riquezas naturais e culturais do país, o Brasil recebeu apenas 6,3 milhões de turistas estrangeiros em 2015, segundo os dados mais recentes da Organização Mundial do Turismo (e que devem refletir mais fidedignamente a realidade, sem distorções criadas pelos megaeventos esportivos de 2014 e 2016), o que nos coloca muito longe dos líderes mundiais – França, Estados Unidos e Espanha recebem pelo menos dez vezes mais turistas. Estamos atrás de Tailândia, Áustria, Polônia, Turquia e Marrocos, para citar alguns poucos países aos quais o Brasil poderia muito bem fazer frente.

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Fato é que o turista estrangeiro tem enorme dificuldade em visitar o Brasil, a começar pela exigência de visto feita a cidadãos de muitas nacionalidades, em nome de uma reciprocidade questionável, já que muitas políticas restritivas têm como objetivo dificultar a imigração ilegal, problema que o Brasil certamente não vive em relação a visitantes de várias nações desenvolvidas. Para quem consegue o visto ou não necessita dele, acrescentam-se outras dificuldades assim que se pisa em solo brasileiro, como a barreira linguística, já que o conhecimento de inglês e espanhol está longe de ser generalizado, e, para os turistas que permanecem nas grandes metrópoles, a violência urbana.

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A política de céus abertos tem o potencial de aumentar a concorrência e beneficiar os brasileiros que pretendem viajar aos Estados Unidos, mas apenas ela não será suficiente para que o Brasil entre de vez na rota dos turistas norte-americanos e possa aumentar sua fatia neste mercado trilionário, que gera renda e emprego. Acreditar que, com uma maior oferta de voos, os turistas estrangeiros passarão a desembarcar aos montes no país é ilusão: se o Brasil quer ser uma potência turística, o trabalho árduo ainda está apenas no começo.