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editorial

Colheita maldita

No ano passado, certa candidata à reeleição presidencial não perdia uma oportunidade de acusar seus adversários de “plantar inflação para colher juros”. Às vezes, Dilma Rousseff se referia diretamente a Aécio Neves; outras vezes, aos tucanos em geral. O PSDB perdeu a eleição, mas a colheita parece estar sendo generosa. Na quarta-feira, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central elevou a Selic, a taxa básica de juros, mais uma vez: agora ela é de 13,25% ao ano, o maior patamar desde dezembro de 2008, ainda no governo Lula. É a sequência de um ciclo de aperto monetário iniciado na semana seguinte à reeleição de Dilma, e os motivos do Copom ficam bem claros: “Avaliando o cenário macroeconômico e as perspectivas para a inflação”, o comitê decidiu pela elevação da Selic em meio ponto porcentual. Ou seja, alguém anda plantando inflação já faz algum tempo – e não são os tucanos.

O IPCA (o índice oficial de inflação) de março de 2015 foi de 1,32%, o maior desde fevereiro de 2003. O acumulado em 12 meses está em 8,13% – o pior índice desde dezembro de 2003. O centro da meta estipulada pelo Banco Central é de 4,5%, com tolerância de dois pontos porcentuais para cima ou para baixo, ou seja, o índice atual está acima até mesmo do teto da meta do BC. Enquanto isso, a economia brasileira anda de lado e a previsão do mercado financeiro para 2015, recolhida semanalmente pelo BC no Boletim Focus, é de retração de 1,1% no PIB.

Se agora o desemprego começou a subir, é porque a economia está estagnada já há muito tempo

Mas inflação, juros e variação do PIB não são os únicos indicadores que merecem atenção no momento. O IBGE vem apontando uma preocupante alta no desemprego: em março deste ano, a taxa subiu para 6,2% – é a maior desde maio de 2011, e não superava os 6% desde junho de 2013. Um levantamento mais completo é oferecido pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), também do IBGE e que não se resume às seis regiões metropolitanas analisadas pela Pesquisa Mensal de Emprego. E os números da Pnad também não são nada bons, apontando desemprego de 7,4% no trimestre entre dezembro de 2014 e janeiro de 2015.

Como já dissemos em várias outras ocasiões, em um cenário de deterioração da economia o desemprego é uma das últimas variáveis a sofrer. Se agora o desemprego começou a subir, é porque a economia está estagnada já há muito tempo. Portanto, setores de esquerda que estejam se preparando para culpar o ajuste fiscal de Joaquim Levy pela queda no número de trabalhadores empregados terão de repensar sua argumentação. O que estamos vendo agora não é a consequência das decisões dos últimos quatro ou cinco meses: foi construído ao longo dos anos anteriores, anos de irresponsabilidade na condução da economia pelo trio Lula, Dilma Rousseff e Guido Mantega.

E, para piorar a situação, remédios que poderiam reaquecer a economia não estão disponíveis desta vez. Juros baixos não são uma opção em um país que sofre com inflação em alta e precisa controlá-la. E desonerações estão fora de cogitação para um governo que precisa desesperadamente colocar as contas em ordem depois de anos de gastança inconsequente. O setor produtivo, assim, está abandonado à própria sorte: se quiser se endividar para investir, terá de fazê-lo pagando juros mais altos, e sem nenhum alívio na carga tributária.

Dilma e Lula semearam gasto público irresponsável, crescimento da economia pelo estímulo ao consumo em vez do estímulo à poupança e ao investimento, uma política industrial baseada na concessão de privilégios aos “amigos do rei” e aos setores que gritavam mais alto: uma combinação que deteriorou a economia e, agora, pune os brasileiros, fazendo-os colher inflação e desemprego – justamente as duas piores mazelas que podem atingir o bolso da população.

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