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A agenda política desta semana reserva para terça-feira a instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) proposta pela oposição no Senado Federal para investigar supostas irregularidades cometidas na Petrobras – a maior e mais emblemática estatal brasileira, cuja importância para a história do Brasil eleva-a quase à condição de verdadeira instituição da República. Olhada deste modo, querer revirar as entranhas da empresa em busca de malversações soa, para alguns, como uma heresia, um crime de lesa-pátria.

Aliás, é desta forma que o governo, em seu esforço para evitar a criação da CPI, procurou argumentar. O presidente Lula foi um dos primeiros a arguir nesse sentido ao afirmar, literalmente. que "num momento de crise internacional, levantar uma CPI contra a Petrobras é ser pouco patriota". Claro, seu pensamento teve o tom amplificado pela voz de vários de seus ministros, que, do sentimento patriótico, passaram rapidamente a mostrar consequências apocalípticas para a estatal e para o próprio país do ponto de vista econômico. A CPI vai provocar volatilidade no mercado, disse, por exemplo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega. É obra dos interessados em privatizar a empresa, afirmou o do Planejamento, Paulo Bernardo.

Embora se deva reconhecer a possibilidade de abalos na credibilidade e no desempenho econômico da empresa a partir de revelações perigosas sobre as tais supostas irregularidades em licitações, patrocínios e sonegação de impostos, os argumentos levantados contra a CPI são frágeis. Se há valores que devem ser preservados – como a simbologia nacionalista que a Petrobras encarna –, há outros que não podem ser desconhecidos. Dentre eles os da boa administração e da ética com que uma empresa pública deve ser gerida.

Não é pela sensibilidade verde-amarela que evoca que a empresa deve ser mantida intocável, protegida pela redoma da inacessibilidade. Ao contrário, tanto quanto (ou mais do que) qualquer outro ente público, exatamente pela importância, as ações por elas praticados devem ser submetidas a permanente crivo, o que só é possível se obedecido o princípio da transparência dos atos públicos. Protegidos pela confidencialidade, excepcionalmente, devem ser apenas aqueles dados que, por legítimos interesses estratégicos e negociais, não devem ser revelados.

Não nos parece que sejam estes últimos os dados objetivos que levaram à criação da CPI. Por meio dela, pretende-se averiguar exatamente a veracidade de indícios de fatos que podem levar a empresa ao descrédito e a prejuízos institucionais e econômicos de grandes proporções. Esta, pelo menos em tese, é a lógica que inspira quaisquer comissões parlamentares de inquérito. E que não se diga que todas "terminam em pizza", pois, se nem sempre levam à punição dos arrolados em irregularidades, no mínimo são importantes como instrumento de esclarecimento da opinião pública sobre realidades que muitos gostariam que permanecessem escondidas. Este é um resultado que não deve, em hipótese nenhuma, ser menosprezado.

O que leva, então, o governo a tentar barrar a CPI (o que não conseguiu) ou, num segundo momento, a fazer valer sua maioria parlamentar para controlá-la? Se não há o que esconder, não há também porque não deixar investigar, mesmo porque se não for constatada qualquer verossimilhança com as irregularidades apontadas, tal resultado passará a constituir-se num atestado de boa conduta a premiar a gestão da Petrobras.

Há entre muitos que se manifestam contrários à CPI o sentimento de que a motivação real de criação é meramente político, visando tão somente a impor desgastes ao governo para tirar vantagens político-eleitorais na sucessão que se avizinha. Não se descarte a hipótese de que, a permear a ideia, estivesse mesmo presente tal motivação – mas também não se deixe de lembrar as claras evidências de que a Petrobras foi submetida, a exemplo de tantos outros órgãos federais, ao aparelhamento do Partido dos Trabalhadores. Logo, se há interesse político de um lado, o há também de outro.

A CPI foi colocada desta forma, pela situação e pela oposição, num aparente jogo de perde-ganha. Não é esta a visão que devemos ter dela. Mais vale manter o jogo democrático e a prática constante em favor da ética na administração pública do que possíveis manobras para o controle do resultado das urnas. Mesmo porque certamente o debate em torno da Petrobras não é e não será o fator determinante desse resultado. Como não foram, para citarmos um exemplo, as revelações acabrunhantes da CPI do Mensalão.

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