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Costuma-se associar o conceito de democracia ao ato de votar. No entanto, o direito de escolher os legisladores e os governantes é apenas uma parte pequena de um verdadeiro regime democrático. Em 1989, depois de quase três décadas de interrupção, os brasileiros recuperaram a possibilidade de eleger seu presidente. Foi um passo fundamental. Mas era apenas o começo.

Desde lá, a sociedade brasileira vem lutando por novas conquistas que aperfeiçoem o regime democrático. Ao contrário do que ocorre na mudança de regime, quando cai um governo e assume outro, essas transformações são lentas. E nem sempre a população percebe a importância que trazem. Mas algumas delas são verdadeiramente revolucionárias.

Foi o que ocorreu na semana passada, com duas leis sancionadas pela presidente Dilma Rousseff. Uma delas cria a Comissão da Verdade – responsável por apurar os crimes contra os direitos humanos perpetrados durante a ditadura militar (1964-1985). A outra estabelece as regras para que os brasileiros tenham acesso a qualquer documentação referente a atos de seus governantes.

A Comissão da Verdade tem um papel fundamental para o resgate histórico de um período sombrio do país. Depois de encerrado o último governo militar, em 1985, o país reiniciou o caminho para a normalidade. No entanto, sabia-se que uma hora seria necessário enfrentar os abusos cometidos em nome da "segurança nacional".

Os crimes cometidos pelo Estado, assim como os perpetrados por grupos de ativistas radicais de esquerda no mesmo período, não são passíveis de punição. A Lei da Anistia, de 1979, não permite. Mas é importantíssimo que os cidadãos tenham o direito de saber o que ocorreu.

Não se trata de vingança, ou de "revanchismo" como chegou a se especular. E, sim, de justiça. O país não pode deixar no ar a mensagem de que é possível praticar violência contra os direitos humanos, sem que nem mesmo haja uma apuração mínima sobre os fatos.

Por outro lado, a Lei de Acesso às Informações Públicas estabelece parâmetros para o futuro da democracia brasileira. Hoje, os governantes muitas vezes se sentem seguros ao praticar "malfeitos" – parafraseando a presidente Dilma– porque sabem da dificuldade que a população tem de fiscalizar seus atos. Mais de 90 países ao redor do mundo já haviam aprovado legislações que garantam acesso a informações públicas. Por aqui, o ex-presidente Lula havia prometido a aprovação da lei. O projeto demorou a sair do forno. E, quando saiu, enfrentou a resistência de gente como os senadores Sarney e Collor. Mas, finalmente, foi aprovado.

Dentro de 180 dias, após a regulamentação, será lei: todo brasileiro terá acesso aos documentos que seus governantes produzirem. Não é pouca coisa. Pelo contrário. Trata-se de um dos mais significativos aperfeiçoamentos da democracia brasileira nos últimos anos.

À sociedade brasileira fica o alento, em meio a tantas notícias de corrupção e desvios de conduta, de que, no longo prazo, nossa democracia vai ficando cada vez mais estável e melhor.

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