As previsões mais otimistas em relação à inflação não se realizaram, e o IPCA continua acelerado. Com o IPCA de 0,86% em fevereiro, o acumulado de 12 meses subiu para 5,2%, perigosamente perto do limite máximo aceitável para 2021 – a meta é de 3,75%, com 1,5 ponto porcentual de tolerância para cima e para baixo. E, sem sinais de que os preços darão alguma folga no futuro próximo, o Comitê de Política Monetária (Copom) tomou uma decisão radical, elevando a taxa básica de juros, a Selic, em 0,75 ponto, para 2,75% ao ano, quando o mercado esperava no máximo uma elevação de meio ponto.
Por mais que a decisão tenha sido unânime, não há como dizer que essa tenha sido uma escolha fácil. A pandemia de coronavírus está se intensificando, com efeitos desastrosos para os negócios cujo funcionamento está novamente interrompido por decisões de prefeitos e governadores, e que encontrarão mais dificuldades com juros mais altos. Foi preciso colocar, de um lado da balança, a aceleração dos preços e, de outro, a ameaça da pandemia ao crescimento econômico. Fiel a seu mandato de controlar a inflação, o Copom concluiu que “o cenário atual já não prescreve um grau de estímulo extraordinário” – não porque esteja ignorando a possibilidade de estagnação econômica, mas por considerar que há risco maior em deixar a inflação escapar do controle, com as consequências que o país já viveu recentemente, como resultado da desastrosa política econômica dos governos de Dilma Rousseff. E, de fato, com a inflação não se brinca.
Recuperar a credibilidade da política econômica é essencial se o Brasil quiser manter juros baixos após o retorno à normalidade pós-pandemia
O comunicado, aliás, ainda deixa aberta a porta para uma nova elevação da Selic em maio: “Para a próxima reunião, a menos de uma mudança significativa nas projeções de inflação ou no balanço de riscos, o Comitê antevê a continuação do processo de normalização parcial do estímulo monetário com outro ajuste da mesma magnitude”. E que riscos seriam esses? O comunicado não deixa dúvidas de que a maior preocupação é com a situação fiscal do país. É “o risco fiscal elevado” que “segue criando uma assimetria altista no balanço de riscos, ou seja, com trajetórias para a inflação acima do projetado”, segundo o texto.
A preocupação se justifica. Ainda que o Congresso venha aprovando algumas medidas que estavam emperradas até algum tempo atrás, o efeito delas no controle das contas públicas é irrisório. O caso mais evidente é o da PEC Emergencial, que poderia ter sido uma ótima ferramenta de recuperação nos casos em que União, estados e municípios estivessem com as despesas fora de controle, mas acabou extremamente desidratada, servindo basicamente de veículo para o governo conseguir a extensão do auxílio emergencial. O relatório da reforma administrativa, prometido para abril, mostrará se também ela corre o risco de ter o mesmo destino.
O fato é que, mesmo que o Brasil consiga vencer logo a pandemia, acelerando a vacinação, o país não será capaz de atrair recursos estrangeiros se não demonstrar capacidade de manter sua saúde fiscal no médio e longo prazo. E, sem a entrada de dólares, continuará a haver pressão sobre o câmbio, um dos responsáveis pela inflação acelerada. A política econômica recente tem sido marcada menos pelo liberalismo e pelo compromisso com o ajuste fiscal, e mais pela busca de amparo legal para elevação do gasto governamental e um viés intervencionista ou estatista, que custou a cabeça de três presidentes de estatais – Wilson Ferreira Junior, da Eletrobrás, e André Brandão, do Banco do Brasil, renunciaram; Roberto Castello Branco, da Petrobras, foi substituído por decisão do presidente Jair Bolsonaro. Recuperar a credibilidade da política econômica é essencial se o Brasil quiser manter juros baixos após o retorno à normalidade pós-pandemia.