Mais uma vez por unanimidade, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) decidiu acelerar o ciclo de aperto monetário na reunião encerrada na quarta-feira, dia 6. Em meados de setembro, a autoridade monetária havia elevado a taxa Selic em 0,25 ponto porcentual; agora, o aumento foi de 0,5 ponto, deixando a taxa básica de juros em 11,25% ao ano. Mesmo levando em conta alguns fatores externos, como as incertezas sobre a economia norte-americana com possíveis mudanças de orientação sob Donald Trump, o comunicado emitido ao fim do encontro deixou claro que, desta vez, os fatores internos tiveram uma influência ainda maior na decisão.
A economia segue crescendo e o mercado de trabalho vem apresentando bons resultados. Isoladamente, são indicadores positivos, mas o Copom observa que existe um “hiato do produto positivo”, especialmente no setor de serviços – a expressão indica uma situação em que o país está crescendo acima do seu potencial, criando pressão inflacionária. Mas, enquanto o hiato do produto mereceu uma breve menção no comunicado, outro elemento ganhou um parágrafo inteiro, até porque trata de algo que tem muito mais capacidade de desestabilizar a economia: a crise fiscal em que o governo Lula enfiou o Brasil, e da qual tem enorme dificuldade de sair.
Mesmo levando em conta alguns fatores externos, o comunicado emitido ao fim da reunião do Copom deixou claro que, desta vez, os fatores internos tiveram uma influência ainda maior na decisão
“Os desenvolvimentos recentes da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros”, afirma o Copom, para dizer logo em seguida que “a percepção dos agentes econômicos sobre o cenário fiscal tem afetado, de forma relevante, os preços de ativos e as expectativas dos agentes, especialmente o prêmio de risco e a taxa de câmbio”. A lógica é bastante simples: quanto mais um governo demonstra disposição em gastar mais do que arrecada, mais arriscado se torna para um investidor emprestar dinheiro ao governo para que cubra seus rombos. Consequentemente, o prêmio – os juros – exigido por quem empresta é maior. Mas o Copom não só descreve o problema; ele também aponta a solução: “uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida, com a apresentação e execução de medidas estruturais para o orçamento fiscal, contribuirá para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária”. Resumindo: se o governo quer uma taxa Selic menor, precisa interromper o quanto antes seu ciclo de gastança e apresentar um pacote “crível” de corte de gastos.
Mas dizer isso a Lula é como falar com as paredes. O presidente se elegeu prometendo gastar mais, sem preocupação com responsabilidade fiscal (algo que o PT sempre criticou), e infelizmente vem cumprindo sua promessa. Mesmo com a inflação pressionando e o dólar subindo, tudo o que o governo tem oferecido até agora é falatório de ministros e promessas de medidas que deveriam ser anunciadas logo depois da eleição, depois foram adiadas sem prazo definido, e por fim seriam divulgadas nesta semana. Haddad chegou a afirmar que os detalhes seriam fechados em uma reunião na manhã desta quinta-feira, mas até o início da noite nenhum anúncio foi feito. Houve até um jogo de cena em que Lula cancelou uma viagem de Fernando Haddad à Europa para passar ao público e ao mercado a impressão de que o presidente está preocupado com o caos fiscal. Acreditou quem quis; na verdade, a decisão deixou implícito que o governo está tentando encontrar um coelho na cartola na base da pressa e do improviso.
A ala mais irresponsável do petismo se manifestou por meio da presidente do partido, deputada Gleisi Hoffmann, que já havia demonstrado no X toda a sua ignorância sobre contas públicas. No dia 4, antes da reunião do Copom, ela havia se queixado de que, nas “conversas da mídia e seus economistas para cortar o orçamento público (...) nada se fala dos juros estratosféricos, que vêm aumentando a dívida”. Ainda que juros em alta de fato elevem a parcela da dívida atrelada à taxa Selic, o que realmente faz subir a dívida brasileira é a necessidade de seguir emitindo títulos para compensar os seguidos déficits primários, causados pelo fato de que o governo gasta mais do que arrecada. O Brasil coleciona déficits primários seguidos desde 2014, quando os efeitos da “nova matriz econômica” petista finalmente se fizeram sentir com força total; desde então, só em 2022 o país teve superávit primário, para voltar ao vermelho em 2023. Não perceber, ou não querer perceber que a melhor forma de ajudar os mais pobres é colocando as contas em ordem para conter a inflação e o câmbio: isso, sim, “dá uma tristeza”.