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Editorial

A covardia da Câmara dos Deputados não apaga o legado de Deltan Dallagnol

Dallagnol
Ong vê que cassação de Dallagnol afeta a segurança jurídica eleitoral e abre precedente para decisões futuras. (Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados)

O Brasil, o Brasil profundo, o Brasil democrático, o Brasil verdadeiro está de luto. Num gesto equivocado, a mesa diretora da Câmara dos Deputados optou, nesta terça-feira (6), por não contestar a decisão gravemente inconstitucional do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de cassar a candidatura de Deltan Dallagnol, deputado federal mais votado pelo estado do Paraná. Em vez de entrar para a história como legítima e corajosa defensora dos interesses dos cidadãos e do próprio Estado Democrático de Direito, os membros da mesa optaram pela cegueira e pela conivência.

Na nota assinada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira, e pelos demais membros da mesa diretora, os parlamentares adotaram o entendimento, mais conveniente para eles, de que não caberia à Câmara, ou a qualquer de seus órgãos, discutir o mérito da decisão da Justiça Eleitoral. É claro que isso não corresponde à melhor compreensão do espírito da Constituição. Havia base legal, sim, para questionar a decisão do TSE, que teve de inventar uma nova possibilidade de inelegibilidade para poder cassar a candidatura de Dallagnol. Esse argumento, inclusive, foi levado à corregedoria da Câmara pela defesa do deputado, mas nem sequer foi considerado. Como explicamos, além de defender o mandato de um deputado legitimamente eleito, cassado injustamente, a Câmara dos Deputados tinha o dever de defender as prerrogativas do próprio Poder Legislativo, que teve sua função de legislar usurpada pelo TSE.

Ainda que abandonado e traído por seus pares, Deltan tem o apoio de todo o cidadão brasileiro que não compactua com a corrupção e nem com os abusos contra o Estado Democrático de Direito.

Mas a Câmara simplesmente optou pelo caminho mais fácil: renunciar ao seu papel e se curvar à desorientação, jurídica e moral, e ao ativismo que caracterizam neste triste momento a atuação das altas cortes do país. A cassação de Dallagnol foi em si mesma, independentemente da consciência ou intenção de seus perpetradores, uma atrocidade inominável.

É vergonhoso que a Câmara dos Deputados, por meio de sua mesa diretora, opte por fechar os olhos ao terrível e inacreditável processo de inversão de valores que avança sobre o país, onde se reabilitam corruptos condenados, blindam-se aqueles ainda não descobertos e se busca desmoralizar quem luta contra a corrupção. É preciso estar muito míope – ou mesmo cego – para não se dar conta da bizarrice deplorável que consiste em ter como presidente da República o responsável pela maior rede de corrupção da história do país, ao mesmo tempo em que se assiste à injusta e implacável punição aos competentes e heroicos agentes que tentaram desarticular o esquema. Nada dessa conduta pusilânime, porém, apaga o legado e o brilho de Deltan Dallagnol. Ao contrário, temos certeza de que sua missão como liderança pública está apenas começando.

Não é sem razão que se diz que são as adversidades que forjam os grandes líderes. Com uma atuação corajosa e irretocável dentro dos âmbitos da Operação Lava Jato e durante sua breve permanência na Câmara, certamente Deltan Dallagnol ainda dará uma contribuição extraordinária para o país. Lembremos sempre que graças ao seu brilhante trabalho à frente da Operação Lava Jato, ao lado de colegas de grande envergadura técnica e moral, foi possível, pela primeira vez na história deste país, escancarar os meandros da corrupção asquerosa que tantos prejuízos trouxe à sociedade e punir aqueles que até então se achavam intocáveis.

Hoje vivemos um momento de profunda tristeza, sem dúvida, mas, ao mesmo tempo, o início de uma nova caminhada. Ainda que abandonado e traído por seus pares, que talvez não tenham tido a estatura necessária para compreender a gravidade do momento pelo que o país atravessa, Deltan tem o apoio de todo o cidadão brasileiro que não compactua com a corrupção e nem com os abusos contra o Estado Democrático de Direito. A abrupta interrupção da carreira política de Deltan Dallagnol é só momentânea, disso temos certeza.

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