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O ministro da Defesa ucraniano, Oleksiy Reznikov, presta homenagem a um soldado morto em combate pelo exército russo.
O ministro da Defesa ucraniano, Oleksiy Reznikov, presta homenagem a um soldado morto em combate pelo exército russo.| Foto: EFE

Ao mostrar para o mundo que está disposto a atropelar praticamente qualquer regra de convivência entre as nações, Vladimir Putin tomou para si o manto da imprevisibilidade, com todas as vantagens e riscos que a característica traz consigo e com todos os dissabores e tragédias que pode causar. Com isso em mente, os estrategistas ocidentais mais precavidos não podem se dar ao luxo de descartar possibilidades, desde as mais trágicas até aquelas que hoje soam como um milagre, de tão improváveis.

O pior desfecho, não apenas para a Ucrânia, mas para toda a humanidade, seria a de o conflito crescer ao ponto de materializar o pesadelo de uma nova guerra mundial. Partindo da informação de que hoje a Rússia é detentora do maior arsenal nuclear do planeta, e poderia ter a China como possível aliada, não é exagero temer as proporções e estragos de um conflito dessa natureza, com desdobramentos completamente inimagináveis. Dado esse horizonte aterrador, é compreensível o esforço coletivo de se evitar qualquer passo em falso, que poderia servir de detonador desse processo. Trata-se, portanto, de uma hipótese remota, mas que precisa estar constantemente como pano de fundo de decisões estratégicas.

No entanto, mesmo que seja improvável que Putin esteja disposto a tal nível de ruptura com o mundo e ainda que seu exército seja preciso o bastante para não cometer erros que ultrapassem as fronteiras ucranianas, uma hipótese de cores quase tão trágicas quanto a anterior é a do recurso, por parte da Rússia, a armas nucleares para vencer a guerra na Ucrânia. Neste caso, a barbárie que isso representaria obrigaria a medidas muitíssimo mais duras da parte do concerto das nações, impondo um desafio diplomático gigantesco.

Outra hipótese, mais provável aliás, é a de a guerra ser rápida, mesmo com o uso apenas de armamentos convencionais, durando em torno de um mês. A invasão dos Estados Unidos ao Iraque, em 2003, por exemplo, levou 21 dias até que o comando do país fosse tomado. Como naquela situação, o conflito atual envolve dois países com poderio militar muito desproporcional entre si. Para esse desfecho, a Rússia teria que controlar todos os aeroportos, fronteiras e acesso ao mar. Se não for completamente destruída, Kiev seria tomada, com ocupação dos principais prédios do governo.

O destino do presidente Volodymyr Zelensky é um ponto crucial para o que virá em seguida. Ele pode fugir, tornando-se um presidente exilado e incomodando à distância as autoridades usurpadoras. Moscou também pode prendê-lo e entregá-lo aos aliados separatistas em Donetsk e Luhansk, áreas reconhecidas agora como repúblicas independentes, as quais, supostamente, o Kremlin veio socorrer. Qualquer das duas hipóteses manteria a insurgência popular, arrastando a instabilidade na região por tempo indeterminado. A bravura dos ucranianos pode levar a uma resistência heróica, que, infelizmente, traz consigo um custo humano muitíssimo elevado.

A outra opção, com relação ao presidente ucraniano, é mais brutal e comum para os padrões da guerra. Os homens de Putin podem simplesmente assassiná-lo, alegando que o mesmo foi morto em combate. Se o esmorecimento dos ucranianos ou um acréscimo de sua disposição de lutar seriam as consequências, é difícil de prever. Igualmente, é difícil de prever quão preparado está o governo russo para silenciar com violência toda oposição em uma Ucrânia ocupada. E, para efeitos de um novo status de paz, pós-anexação, a questão é saber quando Putin pode se dar por satisfeito por ter recuperado parte da influência e protagonismo que seu país há muito havia perdido.

É possível, contudo, que as rigorosas sanções econômicas, somadas às numerosas baixas que a resistência ucraniana está impondo à Rússia, além da perda de popularidade de Putin em seu próprio país por causa da guerra, sejam suficientes para fazer a cúpula do Kremlin convencer o mandatário a encontrar uma saída para a situação, não tão humilhante como seria a de um recuo, mas um meio-termo que possa ser celebrado como vitória plena. Nessa linha, consta no horizonte de muitos analistas um possível acordo no qual o governo ucraniano aceita ceder oficialmente parte de seu território, o que incluiria, logicamente, a Crimeia, Donetsk e Luhansk, além de se comprometer com a desistência de ingresso na Otan. Em troca, o exército russo cessa os ataques e se retira de toda a região centro-oeste do país.

Um acordo desses seria de uma injustiça terrível para a Ucrânia, uma derrota para o Ocidente e abriria um precedente perigosíssimo para anexações futuras – inevitável pensar na relação entre China e Taiwan, por exemplo - mas pode acabar sendo justificado pela imperiosa necessidade de parar o derramamento de sangue.

Por fim, a esperança, mais do que a razão, nos impele a torcer por uma ação providencial que só poderia vir do povo russo. A de que, motivados pela intensa insatisfação de ver seu país se tornando o pária do mundo, um carrasco de inocentes, os cidadãos da Rússia deem início a um movimento popular grande o bastante para contagiar outras lideranças políticas, dotadas de inédita coragem para se contrapor a Putin, depondo-o. Assim, um novo governo russo, mais moderado, negociaria com a Ucrânia e o Ocidente uma solução capaz de amenizar os estragos feitos pelo lunático antecessor, ficando livre das pesadas sanções impostas até aqui, trabalhando, então, para que o continente voltasse à paz de que desfrutava.

Temos ciência do quão utópico parece esse vislumbre, mas se o imprevisível está na equação, não convém que o excluamos. Seria a melhor solução, para a Ucrânia, para a Rússia e para o mundo.

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