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Editorial

Democracia é para todos

A temperatura política subiu nos últimos dias por conta dos desdobramentos dos acidentes aéreos recentes: setores da classe média paulista, ao prestar solidariedade às vítimas, lançaram um movimento de crítica ao governo, respondido em tom forte pelo presidente da República. Nessa situação o melhor é a moderação do bom senso, assegurando a marcha do Brasil para o desenvolvimento dentro da normalidade democrática.

Se, por um lado, conseguiu manter a estabilidade da moeda e reduzir a vulnerabilidade externa a que o país estava exposto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva também fez despertar contra seu governo queixas pelo aparelhamento partidário da máquina estatal, pela cooptação tradicional de maiorias parlamentares e por imprimir um viés ideológico que deu marcha à ré nas reformas modernizantes.

O quadro incômodo chegou ao clímax com o apagão aéreo, que expôs um problema de deficiência infra-estrutural e ainda a má gestão do setor. A indignação pela ocorrência de duas grandes tragédias em dez meses deu impulso a movimentos de mobilização popular, como o "Cansei", sob iniciativa de entidades paulistas. Isso – mais a série de vaias iniciada na abertura dos Jogos Pan-Americanos, no Rio de Janeiro – exacerbou a reação do presidente, de seu partido e de movimentos sociais vinculados. Acusações foram desfechadas contra a elite privilegiada e a imprensa, num linguajar radicalizado que faz lembrar os palanques eleitorais.

O fato é que a vitória de Lula em duas eleições, 2002 e 2006, só ocorreu porque amplos setores da classe média lhe confiaram os votos, ao lado dos "excluídos" – destinatários privilegiados das atenções governamentais. Esses segmentos médios, que hoje saem às ruas, exercitam o mesmo direito democrático que sustentou a marcha inicial de Lula e seu Partido dos Trabalhadores nos idos da redemocratização, como lembrou o governador de Minas Gerais, Aécio Neves.

Numa resposta exemplar, porque comedida, o líder mineiro declarou ser absolutamente legítima a manifestação iniciada em São Paulo em relação a determinadas ações do governo. Este, em vez de reagir emotivamente, deve refletir sobre a razão dos protestos, buscando caminhos de mudança; advertido de que, felizmente para a democracia, o poder é cíclico.

Ainda é cedo para aferir conseqüências mais amplas do desgaste das lideranças chamadas a governar no último pleito, mas cumpre ter presente a lição do pensador francês Daniel Halévy sobre a aceleração da História: "Na modernidade, graças à ciência e às comunicações, o acontecer histórico se acelera e se comprime de maneira perceptível (levando homens e nações a perderem o controle de seus destinos)".

Por último, oposições podem se expressar com veemência, mas o papel de liderança dos governantes exige moderação, consoante sábios como o chinês Confúcio ou Pitágoras, da Antiguidade Grega. Este último ensinou que os dirigentes devem "ter em vista a criação de uma atmosfera de confiança, buscando a harmonia entre os cidadãos e levando em consideração apenas a justiça".

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