O pior momento da crise econômica causada pela pandemia de Covid-19 já ficou para trás? A julgar por dois dados relativos ao emprego no Brasil, ainda é difícil saber. O Cadastro Geral de Empregados e Desempregados, do Ministério da Economia, traz números positivos para agosto, com a criação de 249 mil postos de trabalho com carteira assinada. É o segundo mês consecutivo com saldo positivo (em julho foram 131 mil novas vagas), depois de uma sequência de quatro meses, de março a junho, com mais demissões que contratações.
O mesmo otimismo trazido pelo número total do Caged se mantém quando os números são desmembrados. Isso porque, ao contrário de julho, quando o ramo de serviços ainda demitiu mais que contratou, em agosto todos os setores tiveram saldo positivo, puxados pela indústria de transformação, com quase 93 mil novas vagas. Também na distribuição geográfica houve melhorias, com todos os estados brasileiros e o Distrito Federal registrando aumento no emprego com carteira assinada – em julho, Rio de Janeiro, Sergipe e Amapá haviam registrado mais demissões que contratações.
Mesmo quem se propõe a enxergar o copo meio cheio, priorizando os números do Caged, haverá de admitir que a situação do emprego ainda está longe de ser confortável
Ainda há muito emprego a recuperar, no entanto: no acumulado do ano, o Caged registra o fechamento de 849 mil vagas de emprego formais. A retomada, depois que a pandemia causou um impacto devastador e rápido na economia mundial, sempre será mais lenta. Muitas empresas que geravam empregos estão perdidas; as que sobreviveram não necessariamente já recuperaram a mesma capacidade de antes. A demanda também continuará baixa por algum tempo em muitos setores, como os que envolvem algum tipo de contato humano, a exemplo de restaurantes e eventos, ou os de produtos considerados mais supérfluos, cuja compra pode ser adiada por famílias cuja situação financeira ainda é incerta.
Se os dados do Caged precisam ser comemorados, o IBGE traz um quadro mais sombrio, com o aumento na taxa de desemprego medida pela Pnad Contínua: recorde de 13,8% no trimestre encerrado em julho, o equivalente a 13,1 milhões de brasileiros. Neste mesmo período, a população ocupada caiu 8,1%, passando a 82 milhões, enquanto o nível de ocupação baixou para 47,1% - ambos os números são os mais baixos da série histórica iniciada em 2012. Ao contrário do Caged, que contempla apenas as vagas de trabalho formais, o conceito de “população ocupada” do IBGE inclui empregados com e sem carteira assinada, domésticos, servidores públicos, empregadores e pessoas que trabalham por conta própria.
Alguns aspectos, aqui, precisam ser levados em conta: a porcentagem de desempregados, por exemplo, considera aqueles que não estão trabalhando, mas estão buscando uma colocação no mercado de trabalho – os que não têm emprego e não estão à procura são considerados “desalentados”. Os próprios analistas do IBGE afirmam que as regras mais drásticas de distanciamento e isolamento atrapalharam a busca por emprego de muitos brasileiros e podem afetar os números tanto de desempregados quanto de desalentados. Além disso, os números do IBGE, por se referirem ao trimestre encerrado em julho, ainda não contemplam a geração de emprego formal em agosto registrada no Caged.
Mesmo quem se propõe a enxergar o copo meio cheio, priorizando os números do Caged, haverá de admitir que a situação do emprego ainda está longe de ser confortável, e que é preciso encontrar meios de manter os postos de trabalho atuais e estimular a geração de empregos. A permissão para fazer acordos de preservação de emprego, por meio da redução proporcional de jornada e salário ou da suspensão temporária do contrato de trabalho, deve ser prorrogada por mais dois meses, afirmou nesta quarta-feira o Ministério da Economia. A manutenção da desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia em 2021 depende da derrubada de um veto do presidente Jair Bolsonaro, mas o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), adiou mais uma vez a sessão que trataria do tema. Nestes dias em que tanto se discute o Renda Cidadã e suas fontes de financiamento, é oportuno lembrar a frase do ex-presidente norte-americano Ronald Reagan, para quem “o melhor programa social é um emprego”. Que todo o debate sobre a ajuda aos mais vulneráveis não leve os gestores a esquecer da tão falada “porta de saída” dos benefícios sociais.
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