A presidente Dilma Rousseff ainda está prospectando as razões pelas quais andam falando tão mal da Petrobras. Disse ela, em sabatina do jornal O Estado de S.Paulo: "Eu não tinha a menor ideia de que isso ocorria dentro da empresa", referindo-se ao bilionário esquema de propina denunciado pelo ex-diretor Paulo Roberto Costa. Seu alegado desconhecimento se refere ao suposto esquema que agora é manchete de todos os jornais, mas coincide também com os anos em que a estatal petrolífera brasileira deixou de garantir a autossuficiência na produção de óleo, tão festejada no início do governo Lula, e se envolveu em negócios desastrosos. Dilma, no entanto, não via anormalidades na empresa nem técnicas, nem administrativas, nem morais.
Nesse período de decadência, em todos os mencionados sentidos, que no conjunto levaram à perda substancial de valor da Petrobras, Dilma sucessivamente foi ministra de Minas e Energia (pasta à qual a petrolífera está vinculada), ministra-chefe da Casa Civil da Presidência, presidente do Conselho de Administração da Petrobras e, finalmente, presidente da República. Mas "não tinha a menor ideia" do que ocorria dentro da empresa.
Claro que não se deve exigir da ocupante daqueles altos postos que conheça minúcias do que ocorre nas entranhas da administração pública. Mas é doloroso ter de admitir que essa ausência de cuidados se tenha estendido à mais estratégica das estatais nacionais fonte de riqueza incomensurável, detentora de grande potencial de crescimento e, sobretudo, instrumento de garantia e de promoção do desenvolvimento de um país ainda tão carente na exploração de insumos energéticos.
Confrontada, porém, com dados revelados pela imprensa, Dilma preferiu sair-se por uma confortável tangente. Disse ela, na mesma entrevista: "Não quero dar à imprensa um caráter que ela não tem perante as leis brasileiras. A imprensa não tem nenhum foro inequívoco para dizer para mim se uma pessoa é corrupta ou não. Quem vai falar isso para mim é quem investiga, quem tem as provas". Tem razão a presidente: a imprensa não é a Justiça, mas apresenta fatos que, mais lentamente que o desejável, são depois confirmados por "quem investiga". Logo, não nos parece razoável o desmerecimento que Dilma Rousseff devota ao papel da imprensa livre que agora está também no foco de "quem investiga" para se descobrir quem vazou dados colhidos pela Polícia Federal e que não foram desmentidos por "quem investiga". O esforço por desvendar o vazamento, inclusive, parece tão ou mais intenso que a ânsia por descobrir os detalhes do esquema denunciado por Costa.
A presidente diz estar ainda à espera de dados oficiais para opinar e tomar providências em relação aos supostos desvios na Petrobras atitude que não deixa de configurar uma contradição em termos, pois, se não são "oficiais" as informações da imprensa, não precisaria esperar que viessem à tona pela via de "quem investiga". Bastaria-lhe a repetição do mantra com o verbo no presente: "não sei de nada". Felizmente, preferiu reconhecer uma fumaça de bom conteúdo no que a imprensa já publicou, a ponto de afirmar que "tudo indica que houve" algo de muito errado na Petrobras.
Mas o entorno dessa frase esconde uma profunda contradição. "Se houve alguma coisa [na Petrobras], e tudo indica que houve, eu posso garantir que todas as sangrias que eventualmente pudessem existir estão estancadas", disse Dilma. É no mínimo curiosa a afirmação: se ela não sabia, e se ainda não sabe (porque não lhe chegaram informações "oficiais"), como ela pode ter certeza absoluta de que as sangrias já foram estancadas? Será essa a única informação oficial que ela deve ter recebido? A de que acabaram com as sangrias, mas não lhe disseram quais eram, nem quem seriam os responsáveis?
É tudo muito surreal.
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