A política dos "campeões nacionais" adotada pelo BNDES falhou e o prejuízo é de todos. Não foi por falta de aviso
Na semana que passou, o país teve uma boa notícia no que se refere ao financiamento de empresas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Luciano Coutinho, presidente da instituição, disse "não" aos boatos de que viria do BNDES o socorro para as combalidas operações de Eike Batista.
Há menos de dois meses, Coutinho apresentou-se à Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. Foi questionado diversas vezes sobre o relacionamento do banco com o grupo EBX. Disse que os empréstimos para as empresas X somam R$ 10 bilhões, aproximadamente, mas que o desembolso efetivo não passaria de R$ 6 bilhões isso porque algumas parcelas (conhecidas como tranches no jargão financeiro) não chegaram a ser liberadas em razão do cronograma dos financiamentos. Afirmou também, sem dar maiores detalhes, que o BNDES não perdeu dinheiro com as operações que envolveram a petrolífera OGX. Explicações adicionais ainda são necessárias: se acionistas e credores internacionais tiveram perdas intensas com a companhia, qual foi a mágica contratual do banco para sair ileso?
Nos últimos anos, a feitiçaria contábil do BNDES exigiu sempre a participação do Tesouro Nacional. Só no primeiro semestre deste ano, o banco absorveu R$ 88 bilhões. No ano passado, foram R$ 153 bilhões. Esses aportes fazem com que seja o Estado brasileiro quem, de fato, subsidia os empréstimos feitos pelo banco.
Tais empréstimos têm sido destinados, prioritariamente, a grandes empresas estas absorveram 57,1% dos R$ 375,9 bilhões desembolsados no período abril-junho, de acordo com boletim trimestral de transparência editado pela instituição. Ainda segundo o boletim, essa concentração ocorre em "decorrência da predominância das grandes empresas nos setores de infraestrutura, insumos básicos e bens de capital sob encomenda", setores que o BNDES vem incentivando, com especial preferência aos projetos que fazem parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), um guarda-chuva desenhado para dar aparência estatal a investimentos privados.
Setores preferenciais ou empresas preferenciais? Nos últimos dez anos, o BNDES converteu-se em um poderoso braço financeiro a serviço do governo, capaz de escolher quais grupos empresariais prosperariam. É a política dos "campeões nacionais", que teve no grupo EBX um de seus principais representantes. Houve outros, como BRF, JBS, LBR, Fibria e Oi. A ideia era abastecer de recursos empresas escolhidas e dar a elas condições de se tornarem grandes operadores no mercado internacional, de forma a ampliar a presença global brasileira. Fusões e aquisições foram incentivadas, tendo o BNDES e o Tesouro como casamenteiros.
Deu errado. Muitas dessas empresas naufragaram por inépcia administrativa; outras, porque a união forçada de grupos rivais não deu tão certo quanto se imaginava. Não basta dar dinheiro a uma empresa para torná-la relevante.
Não foi por falta de aviso, porque algo parecido já havia ocorrido antes. Nos anos 70, o Brasil, sob o comando de uma ditadura, também incentivou companhias nacionais sob uma política de escolhas seletivas. Associada à reserva de mercado na informática e ao veto à importação de bens não essenciais, essa política tornou-se uma das causas da paradeira econômica nacional que marcou os anos 80 e boa parte da década de 90.
O BNDES acena com o fim da política dos campeões nacionais, e parece confirmar isso ao negar socorro à OGX. Não era sem tempo.
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