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Editorial 1

Diplomacia desastrada

A decisão do presidente Lula de não reconhecer a eleição hondurenha do úl­­timo domingo, que deu vitória ao candidato conservador Porfírio Lobo, com 55% dos votos, estabelece um sério entrave para a normalização institucional daquele país. Além disso, cria um novo front de tensão no continente americano, já dividido pelos radicalismos do grupo de países liderado pelo presidente Hugo Chávez, da Venezuela. E mais: contribuiu decisivamente para minar o consenso do debate de cúpula dos países ibero-americanos sobre Honduras, encerrado ontem, em Estoril, Portugal. Lula abandonou a reunião antes de seu término e os chefes de Estado e de governo presentes não conseguiram redigir um texto conjunto sobre a crise do país centro-americano.

Desde a quinta-feira anterior à realização do pleito, o governo brasileiro já vinha sinalizando que não reconheceria o resultado eleitoral. Em Estoril, na 19.ª Cúpula Ibero-Americana, Lula foi claro: disse que legitimar o resultado eleitoral hondurenho poderia abrir um grave precedente na América Latina. "É importante ficar claro que a gente precisa, de vez em quando, firmar convicção sobre as coisas, porque isso serve de alerta para outros aventureiros", disse. Lula considerou "um sinal perigoso e delicado" o fato de os golpistas não terem permitido que o ex-presidente Manuel Zelaya voltasse ao poder para coordenar o processo eleitoral. "Ainda existem muitos países, sobretudo da América Central, em situação de vulnerabilidade política. Portanto, o Brasil não tem de reconhecer nem repensar a questão de Honduras", afirmou.

O Brasil sempre defendeu que o governo interino, comandado pelo presidente Roberto Michelleti, deixasse o poder e que o deposto Zelaya retomasse a Presidência, permanecendo no cargo até janeiro (o fim de seu mandato), com o compromisso de não concorrer à eleição. Porém as negociações comandadas pela Orga­­nização dos Estados Americanos (OEA) não resultaram em acordo nesse sentido. Zelaya não concorreu, mas conclamou a população a boicotar o pleito. O apelo não teve o efeito esperado: 60% dos eleitores compareceram às urnas e optaram por Lobo, derrotando facilmente o candidato do Partido Liberal (governista), Elvin Santos.

Os Estados Unidos reconheceram já na segunda-feira o resultado da eleição de Hon­­duras, parabenizando Lobo. Mas o Departamento de Estado disse que o pleito representou apenas um passo parcial em direção à restauração da democracia depois de um período de instabilidades. Ressalvou, também, que o Congresso de Honduras ainda precisa votar a restituição do presidente deposto ao poder e a formação de um governo de unidade nacional.

Ao contrário dos EUA, o Brasil, com sua posição intransigente, fecha todos os canais imediatos capazes de conduzir Honduras à estabilidade democrática. Ao continuar dando guarida a Ze­­laya na embaixada em Tegucigalpa, o país realimenta o foco de tensão que criou ao permitir que o presidente deposto lá se instalasse e ga­­nhasse proteção, endossando seus atos de incitação à violência dirigido a correligionários, primeiramente conclamando-os a um levante civil; depois, a boicotar o pleito.

Não há dúvidas de que essas ações do Brasil em Honduras são representativas da desastrosa gestão diplomática do governo Lula. Elas mancham a tradição de pragmatismo e bom-senso de várias gerações de diplomatas brasileiros e dos sempre bons serviços prestados no exterior pelo Itamaraty.

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