José Dirceu está a apenas uma audiência de deixar definitivamente a Papuda. Mensaleiro condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a sete anos e 11 meses de prisão em regime semiaberto, Dirceu não vai passar nem um ano na cadeia. Preso em 15 de novembro do ano passado, o ex-ministro-chefe da Casa Civil conseguiu abater 142 dias de sua pena graças à leitura de livros, estudo e trabalho. Com isso, ele antecipou o cumprimento de um sexto da pena, requisito para pedir a progressão de regime.
Por mais indignados que muitos brasileiros possam ficar com a possibilidade de ver Dirceu em casa situação, aliás, na qual já estão José Genoino e Delúbio Soares, e que aguarda João Paulo Cunha em janeiro de 2015 , a decisão do ministro do STF Luís Roberto Barroso é perfeitamente legal. Se a legislação parece leniente demais para com os criminosos condenados, que se faça um esforço para alterá-la, em vez de pleitear que ela não seja cumprida só por causa da (má) reputação da pessoa em questão. Mas não é exatamente disso que pretendemos tratar, durante estes últimos dias de Dirceu na Papuda.
Quando da concessão de regime aberto a Genoino, o Partido dos Trabalhadores, em sua página no Facebook, publicou uma foto do ex-deputado com o tradicional braço erguido e as palavras "Liberdade merecida". O texto da Agência PT de Notícias nem sequer mencionava o mensalão. Não há motivos para pensar que será diferente com Dirceu. Afinal, enquanto outras legendas punem ou expulsam seus membros envolvidos em esquemas de corrupção, o PT abraçou os seus, desrespeitando inclusive seu regimento. Foram promovidos atos de desagravo a Dirceu, Genoino, Delubio e Cunha em todo o país, inclusive em Curitiba. Eles eram saudados como "guerreiros do povo brasileiro". A própria presidente Dilma Rousseff, durante a campanha do primeiro turno, evitou criticar essa atitude quando, em entrevista ao Jornal Nacional, esquivou-se da pergunta sobre a maneira como o partido tratava os condenados do mensalão. Perdeu a chance de deixar, a todo o Brasil, uma mensagem dura contra a corrupção.
E o mensalão não foi um escândalo qualquer. Precisamos resistir à tentação de acreditar que "casos de corrupção são todos iguais", ou que "todos são igualmente corruptos". O que houve no primeiro mandato Lula foi muito além da simples corrupção: foi um atentado contra a democracia, uma tentativa de subverter a independência entre os poderes com a compra de apoio parlamentar. Vários ministros do Supremo ressaltaram esse fato durante o julgamento. Carlos Ayres Britto chamou o esquema de "golpe". Celso de Mello falou em "atentado aos valores estruturantes do Estado Democrático de Direito". E não queremos, com isso, diminuir outros escândalos, de governos passados e presentes buscamos apenas ressaltar a gravidade deste caso, em que se montou um esquema para fraudar a democracia brasileira.
E por isso nos dirigimos àqueles filiados, simpatizantes e eleitores do PT que se preocupam com o estado da nossa jovem democracia, que completa três décadas no ano que vem. Pois não conseguimos imaginar que tantas pessoas de bem concordem ou pelo menos não vejam um problema tão grave assim que um partido político exalte como heróis os artífices do mensalão, ou negue a própria existência do esquema, apesar de todas as provas levantadas. Seria esse o preço a pagar pelos indicadores sociais dos governos petistas, o de acolher e reverenciar criminosos condenados por promover um atentado contra a democracia? Que saibamos todos resistir ao simplismo e analisar essas atitudes pelo que realmente significam, especialmente quando se trata daqueles que desejam conduzir os rumos do nosso país.
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