“Há uma mágica em economia? Não. Economia não tem mágica. Economia tem algumas palavras mágicas que não podemos desperdiçá-las. As primeiras palavras mágicas para uma economia dar certo são estabilidade e credibilidade política. A segunda palavra-chave para que um país dê certo, a economia cresça e tudo aconteça bem, é estabilidade na economia. A terceira palavra mágica é estabilidade fiscal. A quarta palavra mágica é a gente ter estabilidade jurídica. E a quinta palavra mágica é a gente ter estabilidade social. São esses cinco componentes, mais a palavra-chave que interessa a todos os empresários: previsibilidade. As pessoas têm que saber o que vai acontecer no dia a dia de cada país.”
O parágrafo acima é um trecho literal do discurso lido pelo presidente Lula no Fórum Empresarial Bolívia-Brasil, em Santa Cruz de La Sierra, no dia 9 de julho. As palavras e as teses nelas contidas são corretas e seriam subscritas por qualquer governo de um país democrático com sistema econômico capitalista, direito de propriedade privada, liberdade de preços, livre comércio, equilíbrio das contas públicas e controle da inflação. Ou seja, um país estruturado sob as bases do liberalismo econômico, da democracia política e das liberdades individuais.
Há um divórcio radical entre palavras e obras, e entre as ideias do discurso de Lula na Bolívia e suas falas anteriores sobre variados temas da economia e da gestão pública
A rigor, o teor do discurso merece apoio e se refere a políticas públicas corretas. Mas há um sério problema: trata-se de um discurso lido, certamente escrito por assessores da Presidência, que não guarda qualquer relação com as ideias do PT e muito menos com as ações práticas do governo Lula. Na realidade, há um divórcio radical entre palavras e obras, e um total divórcio entre as ideias desse discurso e falas anteriores de Lula sobre variados temas da economia e da gestão pública. Ou Lula não teve conhecimento do rascunho do discurso e, portanto, apenas leu o que os assessores escreveram, ou então ele conhecia o teor do texto e não acredita em uma só das ideias ali contidas, mas reconhece que tais ideias soam como música aos ouvidos dos empresários e dos investidores nacionais e estrangeiros.
Em qualquer das duas hipóteses, trata-se de leviandade e de atitude inaceitável, especialmente vinda do presidente da República, pois é de se supor que o primeiro mandatário da nação pelo menos tentará executar as ideias que divulga em seus discursos. Como as ações práticas do governo não seguem, nem estão de acordo com as tais “palavras mágicas” que Lula pronunciou, os agentes econômicos não tomaram nem tomarão decisões de investimentos e negócios baseadas na premissa de que o governo aplicará políticas econômicas e medidas administrativas compatíveis com as ideias exaradas no discurso presidencial.
Esse divórcio patente entre palavras e atos só serve para piorar o ambiente institucional indutor dos negócios. Para registrar um exemplo, não há como conciliar o trecho do discurso de Lula no qual ele fala que “a terceira palavra mágica é estabilidade fiscal” com suas próprias falas durante a campanha e depois de eleito – e que foram muitas – contra a austeridade fiscal e o controle das contas públicas. Lula falou e repetiu várias vezes que o equilíbrio das contas públicas não era importante, que não havia problema algum se o déficit fosse maior e que, portanto, o país tinha de acabar com essa obsessão de reduzir gastos e controlar o déficit, chegando inclusive a debochar da preocupação com as taxas do déficit como porcentual do Produto Interno Bruto (PIB).
Em todo esse cenário é lícito perguntar em qual Lula acreditar: naquele que desdenha e debocha das propostas de controlar o déficit e sinaliza que seu governo vai gastar sem pudor e despreocupado com consequências negativas; ou no Lula do discurso feito na Bolívia, enaltecendo as cinco palavras mágicas da economia, entre elas a estabilidade fiscal. O pior que vai acontecer é a ampliação da incerteza e a confirmação de que Lula tornou-se o principal sabotador de seu governo, pois não passa credibilidade nem quando afirma nem quando nega um mesmo fato.
O trágico é que essa postura não é neutra em termos de consequências, a exemplo do efeito inibidor de investimentos, desestímulo aos negócios, fuga de capitais e redução da ética pública. Enquanto isso, o Brasil, tão carente de bons governos e homens públicos decentes e confiáveis, vai rasgando uma a uma as esperanças de se tornar um país desenvolvido, com mais prosperidade e menos sofrimento social.
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