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Editorial

Distorções que causam atraso

Em 40 anos, apesar das riquezas geradas, Brasil foi incapaz de combater a pobreza de forma eficaz. (Foto: Gazeta do Povo)

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O Brasil é marcado pela contradição de ser um país com imenso território, recursos naturais abundantes e, apesar disso, seguir sendo economicamente atrasado e subdesenvolvido segundo os critérios de renda por habitante, pobreza e miséria. As análises e as discussões públicas, nos meios políticos e nas instâncias de poder a respeito dessa anomalia são constantes e algumas causas dessa contradição se tornaram consenso. Se certas causas do atraso e do entrave ao crescimento são conhecidas, seria de supor que o meio político, as entidades empresariais e os círculos de poder devessem tratar tais causas como prioridades absolutas a serem enfrentadas. Porém, há um campo inexplorado e aberto à investigação sociológica: tentar entender por que o Brasil não consegue esquematizar o diagnóstico, definir as soluções e dedicar a vida política pública e privada a um plano para superar as distorções que causam o atraso.

Na intenção, todas as pessoas, sobretudo políticos e autoridades, fazem belos discursos em favor do crescimento econômico e do desenvolvimento com justiça social. Mas, entra década e sai década, o Brasil não consegue crescimento robusto do Produto Interno Bruto (PIB) nem sai do círculo vicioso de pobreza, miséria, desemprego e profundas desigualdades. Qualquer medição econométrica mostrará que a economia brasileira cresceu até bastante nos últimos 40 anos, o que pode dar a impressão (falsa) de que não é verdade a afirmação sobre a incapacidade do país em crescer e enriquecer. A questão central desse problema está em que efetivamente o PIB de 2021 é muito maior que o PIB de 1980, mas esse dado esconde a incapacidade de enriquecimento da sociedade, por uma razão elementar e pouco compreendida: o PIB cresceu em termos totais reais, mas a população era de 120 milhões de habitantes em 1980 e termina dezembro de 2021 com 213,9 milhões.

O país avançou em algumas regras nos últimos tempos, mas o que já foi feito, em comparação com o quanto falta regulamentar, ainda é pouco e insuficiente para transformar o Brasil em uma máquina com velocidade muito maior que a atual

Se o crescimento do PIB ocorre a uma taxa igual à taxa de crescimento populacional, o produto por habitante não sai do lugar; logo, o crescimento se torna insuficiente para tirar o país do atraso e da pobreza. Isso foi o que aconteceu com o Brasil, com a agravante de que a dinâmica do crescimento de ambos – do PIB e da população – se fez com aprofundamento das desigualdades. E nunca é demais repetir que o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), órgão do governo federal, já fez vários estudos mostrando que uma das causas da concentração de renda no país é o setor público. Ao retirar mais de um terço da renda nacional e direcionar, com distorção, os gastos para o custeio da máquina estatal (com seus salários, desperdícios, distorções e privilégios de classe dentro do próprio setor público), para investimentos e programas sociais, o governo (municípios, estados e União, com seus três poderes) contribui para a desigualdade.

No ano que vem, o Brasil terá eleições estaduais e federais, momento bom para que voltem às manchetes e às discussões alguns assuntos importantes nesse cenário de problemas. A lista de causas dessa situação pode variar, mas é certo que entre os entraves ao crescimento e ao desenvolvimento alguns assuntos estão sempre presentes. Corpo de leis ruins; distorção federativa e confusão na distribuição dos papéis da União, dos estados e dos municípios; leis complementares previstas pela própria Constituição Federal que nunca são feitas (a exemplo da regulamentação do direito de greve dos servidores públicos); reformas necessárias que nunca saem (caso das reformas tributária, política e administrativa); obras paralisadas que não são terminadas (relatório do Tribunal de Contas da União, feito em 2019, listou 14 mil obras paralisadas); baixa produtividade do gasto público (entre as causas estão a ineficiência geral, o inchaço da máquina estatal e a corrupção); insegurança jurídica e ambiente institucional que desestimulam o investimento e o crescimento... são alguns dos temas de uma lista que vai muito mais longe.

É bem verdade que o país avançou em algumas regras nos últimos tempos, como o marco regulatório do saneamento, o marco regulatório das ferrovias (em fase de sanção pelo presidente da República), as concessões de infraestrutura portuária e aeroportuária, a Lei de Liberdade Econômica e outras medidas. Mas o que já avançou, em comparação com o quanto falta regulamentar – caso da regulação do investimento estrangeiro e da abertura internacional –, ainda é pouco e insuficiente para transformar o Brasil em uma máquina com velocidade muito maior que a atual.

A recessão provocada pela pandemia atingiu o mundo inteiro e, com o avanço da vacinação e a melhoria do quadro sanitário geral, a crise econômica caminha para ser superada e o ano de 2022 começa com perspectivas otimistas quanto ao fim da pandemia (ainda que certa variante do vírus tenha voltado a assustar o mundo neste fim de 2021). Quando a recuperação se instalar, mesmo que em velocidade lenta, os capitais internacionais retornarão em sua circulação pelo mundo na busca de oportunidades de investimentos produtivos e, também, aplicações em ativos financeiros. Se o Brasil não começar uma séria maratona para superar pelo menos parte daquelas reformas e entraves acima citados, o país pode não aproveitar a boa onda e deixará de se beneficiar dos capitais externos.

Muito já se falou que um bom corpo de leis e sua estabilidade econômica, política e jurídica constituem um bem público capaz de promover os investimentos, o progresso material e o desenvolvimento social. Assim, eleição é momento de não deixar esses assuntos morrerem e, principalmente, fazê-los com presença insistente nos debates, discussões partidárias e esclarecimento aos eleitores. O Brasil tem pressa.

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