Na mais recente reunião do Conselho de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), ocorrida em 6 de novembro, o órgão aumentou a taxa Selic para 11,25% ao ano. Embora essa taxa pareça excessiva e alimente os comentários de que o Brasil tem uma das mais altas taxas de juros do mundo, é importante observar, como fizemos neste espaço dias atrás, que essa Selic trata da taxa nominal bruta. É nominal por não descontar a taxa de inflação – que, segundo o boletim Focus, está prevista para fechar o ano com IPCA de 4,6% e viés de alta para os próximos meses – nem o Imposto de Renda sobre o rendimento da aplicação. A taxa de juros real líquida, no fim, ficaria em torno de 4,4% ao ano, correspondentes à Selic de 11,25%, menos 2,25% de IR e menos 4,6% de inflação. Ressalve-se que essas cifras podem variar conforme variem as alíquotas de impostos sobre rendimentos financeiros, sem que isso altere a estrutura matemática dos valores referidos.
Essa explicação é importante para aclarar o real impacto da taxa Selic sobre as finanças públicas e sobre a dívida do governo indexada à Selic, e permite observar que uma taxa de juros real líquida de 4,4% não é alta nem baixa, mas uma taxa relativamente normal em termos da lógica do mercado financeiro e do incentivo ao ato de poupar, sobretudo em um país de economia instável. Os elementos mencionados nos cálculos de juros a partir da Selic fazem que a comparação entre a Selic bruta e as taxas de juros internacionais (por exemplo, a taxa de juros sobre os títulos do governo norte-americano) somente faça sentido se forem feitos ajustes computando a inflação e os impostos sobre rendimentos financeiros.
O aumento da dívida pública de forma indefinida é fonte de problemas graves, como inflação, recessão e empobrecimento
Se a economia brasileira estivesse saudável e se as previsões sobre a inflação não fossem pessimistas (há quem preveja inflação com trajetória ascendente nos próximos meses), a taxa Selic bruta poderia não ter sido aumentada. Mas, mesmo com a sucessão no BC já devidamente definida, com o indicado de Lula tendo sido aprovado pelo Senado, o Copom optou por elevar a Selic, pois vê possibilidade de aumento da inflação, trajetória ascendente da dívida do governo e altos déficits fiscais que o presidente Lula reluta em reduzir.
O aumento da dívida pública, por si só, não seria um problema caso o total estivesse abaixo dos padrões atuais. Entretanto, vale mencionar o documento divulgado em outubro passado pela Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão do Senado Federal, citando que a dívida pública atingiu 78,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em agosto passado e deve encerrar 2024 com a relação dívida/PIB chegando a 80%. A motivação do Copom para elevar a taxa Selic é a tendência ascendente da inflação, a magnitude da dívida pública como porcentual do PIB, os déficits constantes e a recusa do governo em aceitar a ideia de que é preciso controlar as finanças públicas e inverter a curva dos déficits fiscais.
O problema é que o presidente Lula da Silva já declarou mais de uma vez de forma enfática que ele não vê sentido em respeitar qualquer teto de gastos nem a redução dos déficits nas contas do governo, usando o velho argumento de que a austeridade fiscal prejudica os pobres. No caso brasileiro, ainda há a agravante de que o déficit fiscal não decorre de gastos para construir obras de infraestrutura física e, assim, elevar a capacidade produtiva da economia nacional – pelo contrário, o déficit decorre de aumentos sistemáticos nas estruturas burocráticas, nas despesas com pessoal e nos gastos com custeio da máquina pública. Já está mais que provado que a máquina estatal brasileira, nos três poderes, é um monstro que só cresce e se enche de benefícios, os quais em alguns casos fazem os salários mensais dos funcionários beneficiados serem superiores aos limites dos tetos legais.
É importante registrar que a realidade econômica mundial dos últimos 300 anos ofereceu vários exemplos de que o aumento da dívida pública de forma indefinida é fonte de problemas graves, como inflação, recessão e empobrecimento, principalmente porque quem empresta dinheiro ao governo na moeda nacional, comprando os títulos emitidos pelo governo, são pessoas e empresas. Assim, a insuficiência de poupança nacional e fundos financeiros para bancar os déficits públicos obriga o governo a aumentar impostos ou imprimir dinheiro, práticas que causam inflação e empobrecem a população.
No eixo estrutural da economia nacional, há cinco variáveis macroeconômicas decisivas e inter-relacionadas: PIB, emprego, taxa de juros, inflação e dívida pública. As oscilações para mais ou para menos em cada uma dessas variáveis provocam alterações positivas ou negativas para o eixo estrutural da economia, que é um esquema técnico do sistema econômico capaz de melhorar ou piorar o crescimento e o bem-estar social. Se as autoridades forem incompetentes na administração da complexa máquina econômica e agredirem a lógica desse eixo, a população sofrerá no curto e não enriquecerá no longo prazo.