Na hipótese de as investigações do Ministério Público virem a apontar como únicos culpados pelas denúncias levantadas na série "Diários Secretos" da Gazeta do Povo e da RPCTV os que tiveram prisão temporária decretada, duas capacidades dos deputados estaduais da atual legislatura estarão em xeque. A primeira delas refere-se à competência para serem fiscalizadores da Administração Pública. A segunda refere-se à sua competência para serem administradores dos recursos públicos.

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No sistema político brasileiro, a fiscalização é provavelmente a principal função do representante eleito para o Poder Legislativo. Como a maior parte das matérias importantes é de iniciativa legislativa do Poder Executivo, fiscalizar os atos do governo, assim como a aplicação do orçamento público acaba sendo a principal tarefa dos parlamentares. Contudo, no caso da Assembleia, os deputados demonstraram ser incapazes de fiscalizar o próprio órgão que representam.

Mesmo que nenhum dos deputados tenha se beneficiado dos esquemas de desvio de dinheiro do Legislativo, o simples fato de nunca terem levantado a possibilidade de isso acontecer é, no mínimo, de uma ingenuidade tamanha que demonstra sua total incapacidade de realizar a fiscalização do Poder Executivo. Ou, pior, se alguma vez souberam do que acontecia e nada fizeram, essa omissão é injustificável.

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Honestamente, contudo, é difícil acreditar que não houvesse a menor desconfiança de que havia algo de errado na Casa, até porque sempre houve relutância da Direção do Le­­gislativo em fornecer os Diários Oficiais e as listas de funcionários. Nunca é demais lembrar que os Diários estão ocultos desde pelo me­­nos 2007 e a lista de funcionários só foi di­­vulgada no ano passado. Essas informações foram publicadas pela Gazeta. Muito difícil que deputados, e mesmo o Ministério Público, tenham se surpreendido com as denúncias levantadas. A relutância em abrir as informações da Casa, apesar do discurso de transparência, mostrava que havia o que esconder.

O segundo ponto demonstra a incapacidade de agirem com responsabilidade na gestão de recursos públicos. Se fossem sócios de uma empresa, deixariam que os recursos fossem geridos sem controle pelos funcionários? A resposta é óbvia. Então, por que, quando se trata de dinheiro público, como no presente caso, houve essa displicência? No mínimo, faltou aos deputados responsabilidade na administração de dinheiro público.

Não faltou responsabilidade apenas ao presidente da Assembleia Legislativa, deputado Nelson Justus, do Democratas, e ao primeiro-secretário, deputado Alexandre Curi, do PMDB. Embora eles tenham o dever de administrar o Legislativo de forma transparente e eficiente, como determina a Constituição da República, faltou responsabilidade a todos os representantes. Pois, de alguma forma, poderiam ter demonstrado terem competência para fiscalizar o próprio Poder que representam. Poderiam também ter demonstrado serem competentes administradores do dinheiro público. Mas, como as evidências até agora mostram, nada disso fizeram.

O pior de toda essa onda de irregularidades à qual está exposta a Casa do Povo é que, mesmo com mais de 40 dias de denúncias, os parlamentares demonstram que ainda não se deram conta da gravidade da situação. O tempo de reação deles aos acontecimentos indica, no mínimo, uma dificuldade para lidar com uma crise sem precedentes que assola o Legislativo. Resta saber se os parlamentares estarão preocupados a resolver de forma eficiente os problemas pelo qual passa a Casa que não é deles, mas do povo que representam. Isso, claro, antes das eleições de outubro.