A ocorrência de um foco de febre aftosa na Argentina, ao lado dos recentes registros dessa doença do gado no Brasil, demonstra a necessidade de um controle conjunto, tarefa que o Mercosul poderia ter assumido há tempos como acordo de integração continental no Cone Sul do continente. É que, embora podendo acelerar o fim do embargo à carne bovina brasileira, a confirmação do novo foco no país vizinho opera contra todos os produtores sul-americanos, por expor a fragilidade do continente na vigilância sanitária.
A nova manifestação ocorreu numa fazenda da província de Corrientes, norte da Argentina, junto à fronteira paraguaia e distante cerca de 250 km do Brasil. Vale registrar que o foco brasileiro surgido em Mato Grosso do Sul também se situava junto à divisa com o Paraguai (dali se espalhando para o Paraná, numa situação ainda hoje controversa). Essa coincidência de origens reforça a conveniência de atuação conjunta para debelar o mal em todo o continente, devido aos prejuízos que causa ao impedir nossa pecuária de consolidar sua posição como geradora de excedentes exportáveis de classe mundial.
Segundo estudo da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, a descoberta da aftosa em setembro impediu que nosso setor de carnes mantivesse o ritmo de expansão anterior, ocasionando prejuízos por toda a cadeia produtiva. Uma das conseqüências é que o criador, descapitalizado com a interrupção das exportações, dobrou o abate de matrizes bovinas comprometendo o futuro do setor.
Para a safra de grãos em curso o problema está na estiagem, que afetou a produtividade das lavouras em estados-chave como o Paraná. Por isso é prudente limitar a previsão da safra 200506 em torno de 120 milhões, ante as 123 milhões de toneladas projetadas por órgãos governamentais. Poucos cultivos escaparão dessa colheita de problemas, entre eles a laranja, o café e a cana-de-açúcar. No primeiro caso, a imposição de sobretaxa pelo governo norte-americano pode afetar a rentabilidade dessa commodity, salvando-se o setor sucro-alcooleiro, pela demanda firme e preços em alta. Segundo uma publicação do setor a melhor rentabilidade da cana, valorizada em cerca de 15%, aliviou as perdas do agronegócio em 2005.
Porém se o produtor ganhou mais, na ponta do consumo a majoração do álcool deixou a desejar: só em janeiro o litro subiu 9,87%, contribuindo para realimentar a inflação. As tentativas de estabilizar cotações não deram certo porque "o governo trata o álcool de forma amadora", diz o usineiro Maurílio Biagi Filho. Ele lembra que o governo não cumpriu a lei que manda formar estoques reguladores do produto para a entressafra, em que poderiam ser utilizados recursos da Cide o imposto dos combustíveis.
Mesmo assim, as usinas vão tentar amenizar a crise: no dia 1.º de março, começa no Paraná a moagem antecipada da cana, o que no país representa um volume adicional de 620 milhões de litros até abril.