
Se há uma questão que há décadas atormenta o Brasil e o ajuda a manter-se na posição ingrata de país do futuro que nunca chega, é a falta de uma educação de qualidade. Rankings e avaliações internacionais periodicamente nos lembram o quão atrasado o Brasil está em relação a outros países quando o assunto é educar bem – o que impacta diretamente no desenvolvimento social e econômico do país. Em todos os níveis, das séries iniciais à pós-graduação, o sistema educacional brasileiro patina desastrosamente. Trata-se de um problema sério e grave, que não vai ser resolvido com gritarias e militância política, como se viu no Conae 2024, que serviu até de palanque para Lula pedir votos para seus candidatos a prefeito e vereador.
A Conferência Nacional de Educação (Conae) 2024, realizada no final de janeiro, em Brasília, reuniu representantes da área educacional e de organizações de todo o país para debater as diretrizes que vão nortear o sistema educacional brasileiro pelos próximos 10 anos. Em tese, o evento serviria para discutir e aprovar (ou não) as propostas encaminhadas pelo governo Lula para o Plano Nacional de Educação (PNE), através de um debate democrático entre representantes de diversos segmentos. Na prática, serviu apenas para mostrar como o governo federal petista consegue usar seus tentáculos junto a movimentos sociais e sindicais para monopolizar os debates, calar divergentes e empurrar goela abaixo da população um plano de educação que coloca a educação em segundo plano.
Talvez interesse ao governo de Lula e seus aliados que a educação brasileira continue entre as piores do mundo, mas isso não interessa ao país.
Participantes relataram – a imprensa só pôde acompanhar a abertura e a cerimônia de encerramento do evento – falta de transparência na organização, ausência de espaço para debate, excesso de participantes de entidades e grupos alheios à educação e que qualquer tentativa de contrapor as propostas do governo era rechaçada. Delegados cujas ideias fugiam do viés ideológico majoritário dos participantes da conferência ouviram vaias e palavras de ordem para censurá-los. O deputado Gustavo Gayer (PL-GO) publicou em sua conta no Instagram um vídeo que mostra um pouco do que foi o evento. Entre outras coisas, a gravação mostra um livreto com título Por que discutir gênero na escola? e bottoms em apoio ao Hamas, grupo terrorista da Palestina. Em outro trecho do vídeo, um rapaz que se diz representante do movimento LGBTQIA+ afirma que “a gente está formando militantes mesmo. A gente precisa manter viva a militância em sala de aula”.
No encerramento da conferência, o próprio presidente Lula evidenciou o caráter político do evento. O presidente cobrou apoio para que a esquerda consiga eleger vereadores e prefeitos nas eleições municipais deste ano. “Este ano vai ter eleição para vereador e prefeito. Qual será o nosso papel nessas eleições? Será que os professores do Brasil inteiro não têm condições de eleger um vereador em cada cidade?”, disse o presidente, que também se queixou do crescimento da “extrema-direita” e da “política de costumes tomando conta dos interesses maiores a nível nacional”.
Nos documentos que serviram de base para o Conae, o predomínio do teor político e identitário sobre o educacional já era evidente, como mostrou reportagem da Gazeta do Povo. O material propõe que o Sistema Nacional de Educação (SNE) fomente condições institucionais que permitam o debate e a promoção da diversidade “de gênero e de orientação sexual”, sugerindo a formulação de “políticas pedagógicas e de gestão específicas para este fim”. Em outro trecho, considera a necessidade de uma contraposição urgente “às políticas e propostas ultraconservadoras”, garantindo a “desmilitarização das escolas”, “o freio ao avanço da educação domiciliar (homeschooling)” e “às intervenções do movimento Escola Sem Partido e dos diversos grupos que desejam promover o agronegócio por meio da educação”. O texto também pede explicitamente a revogação de políticas como a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a Base Nacional Comum Formação e a reforma do novo ensino médio, que são tratadas como “agendas neoliberais”. Há também trechos sobre políticas salariais para professores.
Sobre educação de fato, muito pouco. Especialistas que analisaram o documento mostraram preocupação com as críticas a padrões concretos de qualidade, e a falta de métricas para acompanhar o resultado e desenvolvimento dos estudantes. Em nome da uma falsa inclusão, defende-se um nivelamento por baixo, com pouca exigência acadêmica – e consumação da mediocridade educacional. Não há menção ao que poderia, de fato, impactar positivamente na qualidade do ensino brasileiro e incrementar o nível de aprendizado, as habilidades em ciências, matemática, linguagem dos estudantes brasileiros. Com base nas propostas apresentadas no Conae, o Ministério da Educação deverá elaborar o texto final do Plano Nacional de Educação que será encaminhado para apreciação do Congresso Nacional. Caberá aos parlamentares analisarem e decidirem pela aprovação ou não do plano.
É estarrecedor pensar que a educação brasileira dos próximos 10 anos poderá ser pautada por teses aberrantes como as apresentadas no Conae 2024, que priorizam a formação de militantes e discussões identitárias em vez da própria educação. Talvez interesse ao governo de Lula e seus aliados que a educação brasileira continue entre as piores do mundo, mas isso não interessa ao país. O Brasil precisa de um sistema educacional de qualidade, capaz de formar estudantes com excelência acadêmica e humana, que leve o país em direção ao desenvolvimento social e econômico e não mais um projeto de manutenção do atraso.
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