Os resultados das eleições de 5 de outubro, que definiram o governo de vários estados e que conduziram ao segundo turno do pleito presidencial o tucano Aécio Neves e a petista Dilma Rousseff, têm despertado um lado deplorável do brasileiro, especialmente nas mídias sociais: o preconceito, especialmente regional ou de classe social. Assim que surgiram os números definitivos, mostrando que Dilma venceu na maioria dos estados do Norte e Nordeste, enquanto Aécio predominou na maioria dos estados das regiões Sul e Sudeste, insultos começaram a ser disparados em todas as direções.
Os nordestinos são as principais vítimas do preconceito, classificados nas mídias sociais como "vagabundos", "burros", "sem cultura", que se vendem por qualquer migalha. Associações entre o Bolsa Família e o voto em Dilma são frequentes por parte dos que fazem afirmações desse tipo. Mas militantes de esquerda também não pouparam paulistas, paranaenses, catarinenses e pessoas de outros estados que elegeram governadores tucanos ou votaram majoritariamente em Aécio Neves, bem como em candidatos à Câmara como Marco Feliciano e Jair Bolsonaro. Perfis no Tumblr, como o "Esses Nordestinos" e o "Esses Paulistas", reúnem as frases preconceituosas que vão sendo coletadas na internet.
O que falta a todas essas pessoas, além do mais básico respeito aos demais, é a compreensão de que o "um homem, um voto" é um princípio essencial da democracia. O voto do nordestino vale tanto quanto o do sulista; o do beneficiário do Bolsa Família, tanto quanto o do multimilionário; o do analfabeto, tanto quanto o daquele que tem doutorado; o do conservador, tanto quanto o do estatista.
E a consciência de cada eleitor é inviolável. Algumas semanas atrás, a Gazeta do Povo lembrava, em editorial sobre a proposta de excluir das eleições os beneficiários de programas governamentais, que cada um tem o direito de levar à urna "suas convicções, suas circunstâncias e, por que não?, suas gratidões e lealdades". Não compreender esse aspecto básico do ato de votar é falsificar a democracia, que só passa a ser boa "quando os outros votam como eu". Há quem prefira votar no candidato que defenda determinado grupo ao qual o eleitor pertence ou com o qual simpatiza; outros se guiam pelo histórico de realizações do político em sua cidade, bairro ou mesmo em sua rua; há quem analise planos de governo, quem risque da sua lista candidatos ou partidos envolvidos em escândalos, e quem vote guiado por laços de parentesco ou amizade. Tudo isso é perfeitamente legítimo.
Todos podemos e devemos nos esforçar para que o eleitorado, como um todo, busque mais informação sobre os candidatos (papel que a Gazeta do Povo busca cumprir não só com seu noticiário, mas também com ferramentas como o Candibook); compreenda como as convicções políticas e partidárias afetam a sociedade; entenda que o político ladrão pode até conseguir uma ou outra obra para sua base eleitoral, mas sua desonestidade tira dinheiro que deveria beneficiar ainda mais a população. Podemos lamentar especialmente que candidatos notoriamente corruptos continuem a ser eleitos e reeleitos, tanto para o Executivo quanto para o Legislativo. Mas nada disso nos autoriza a tratar com preconceito o eleitor que escolhe de uma maneira diferente da nossa. "Antes de criticar alguém, lembre-se de que nem todos tiveram as oportunidades que você teve", diz o pai de Nick Carraway, o narrador do romance O Grande Gatsby, de F. Scott Fitzgerald é um conselho que vale para todos nós.
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