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A Comissão Especial criada na Câmara dos Deputados para discutir a reforma política se mostra dividida em vários pontos, como o financiamento de campanha e o fim da reeleição. Em um tema, no entanto, parece haver consenso: reportagem publicada na segunda-feira, dia 23, pela Gazeta do Povo mostra que está consolidada, dentro da comissão, a ideia de unificar as datas das eleições municipais, estaduais e presidencial: de 25 deputados entrevistados pelo portal G1, 21 eram favoráveis à unificação do calendário eleitoral.

À primeira vista, parece uma proposta sensata e que tem bons argumentos. Um deles é o de acabar com a paralisia que afeta o Poder Legislativo a cada dois anos. Parlamentares já não têm nenhuma vergonha de instituir “recessos brancos” para participar de campanhas – próprias ou de apadrinhados –, numa omissão que prejudica o país. Além disso, não mais veríamos políticos eleitos pelo povo abandonando seu trabalho pela metade, em busca de um salto na carreira: vereadores que querem ser deputados, deputados que desejam ser prefeitos, prefeitos que tentam o governo estadual, e assim por diante. Um terceiro argumento seria a possibilidade de surgirem novas lideranças políticas naqueles partidos que se dispusessem a lançar candidatos para as três esferas de governo.

No entanto, por mais que esses argumentos mereçam nossa consideração, há outros elementos que, a nosso ver, justificam a manutenção da situação atual, com eleições a cada dois anos. O mais importante deles é a relevância que as eleições municipais precisam ter em nossa sociedade. Com um calendário unificado, as atenções inevitavelmente seriam monopolizadas pelo pleito federal, sobrando um pouco de espaço para as eleições estaduais e, por fim, um fiapo de importância à escolha de prefeitos e vereadores.

Quatro anos de intervalo entre eleições significariam um longo tempo sem que a política estivesse na ponta da língua do brasileiro

Apesar do seu jeito confuso de se expressar, a presidente Dilma Rousseff às vezes consegue dizer algumas verdades. Uma delas veio em abril de 2013, na abertura do II Encontro dos Municípios com o Desenvolvimento Sustentável: “É lá nos municípios que ocorre a vida das pessoas. Ninguém mora no estado, ninguém mora na União, as pessoas moram em cidades”, afirmou Dilma na ocasião. É verdade que vivemos um federalismo torto, em que a União concentra muitas atribuições que poderiam muito bem estar nas mãos dos estados e municípios. Mas ainda assim é o poder público municipal que está mais próximo da vida do cidadão, e a escolha dos políticos que definirão o futuro dos municípios não pode ser relegada ao terceiro plano.

Além disso, por mais que o voto não seja a única maneira de ação política por parte do cidadão, ele é um exercício importante de cidadania. Para muitos brasileiros, o período eleitoral ainda é a única oportunidade de falar de política – uma necessidade fundamental em uma democracia jovem como a nossa. Assim, quatro anos de intervalo entre eleições significariam um longo tempo sem que a política estivesse na ponta da língua do brasileiro. Mesmo democracias muito maduras reconhecem essa necessidade e não unificam suas eleições – o caso extremo é o dos Estados Unidos, em que a Câmara dos Representantes é renovada a cada dois anos e, quando um deputado morre ou renuncia, o distrito a que ele pertencia faz nova votação. Cada estado ou cidade define seu próprio calendário eleitoral, o que significa que todo ano há eleições ocorrendo em algum ponto do país – sem falar em plebiscitos, referendos e até mesmo a possibilidade de recalls, votações em que o eleitorado decide remover um político detentor de cargo eletivo antes do fim de seu mandato.

Diz o bordão que “só se aprende a votar votando”. Se realmente é assim, é bom que os brasileiros continuem a ir às urnas a cada dois anos. Espaçar essa oportunidade para uma vez a cada quatro anos – ou cinco, caso vinguem as propostas de acabar com a reeleição e estender os futuros mandatos – é prejudicar este aprendizado tão vital para a formação de uma sociedade preocupada com a boa política.

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