A crise financeira deixará importantes lições que, uma vez aprendidas, poderão levar à melhoria do mercado e ao fortalecimento da liberdade econômica, desde que sejam feitas as reformas e as modernizações necessárias. O desafio dos políticos é fazer modificações nas leis e na estrutura do poder regulatório e fiscalizatório do governo. Entre as áreas carentes de reformulações está a defesa da concorrência e a consequente coibição das práticas danosas ao mercado e ao consumidor.
No Brasil, os órgãos encarregados da defesa da concorrência trabalham sob uma legislação próxima de completar 15 anos, portanto, velha o bastante para exigir atualização, além de operarem sob uma estrutura confusa de órgãos administrativos. O órgão mais visível é o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), cujo papel é de instância julgadora dos processos que lhe são submetidos, em especial aqueles vindos do Ministério da Fazenda e do Ministério da Justiça.
As mudanças necessárias, que de certa forma já foram iniciadas em 2005 por proposta do Poder Executivo ao Congresso Nacional, devem cobrir pelo menos dois pontos principais: um diz respeito à definição clara das regras sobre monopólios, oligopólios, cartéis, dumpings, trustes, fusões e todas as formas de práticas que possam prejudicar a concorrência entre as empresas ou atentar contra os interesses do consumidor; o outro ponto refere-se à necessidade de simplificar a estrutura de órgãos encarregados de investigar e instruir os processos submetidos ao Cade, com o objetivo de dar agilidade e eficiência aos processos.
Atualmente, um processo de fusão entre empresas, por exemplo, demora tanto que, quando termina, a situação real pode estar em estágio tão avançado em que não existem condições de volta, sem contar que as nossas regras de fusão de empresas trazem o espírito dos anos 80, estando, portanto, superadas. O problema da demora e da falta de eficiência no andamento dos processos deriva, pelo menos em boa parte, da estrutura administrativa com mais de um órgão cuidando do mesmo assunto, como é o caso de duas secretarias ministeriais: a Secretaria de Acompanhamento Econômico (SEAE), do Ministério da Fazenda, e a Secretaria de Direito Econômico (SDE), do Ministério da Justiça. A primeira necessidade é a reforma do organograma e da distribuição de funções dos órgãos envolvidas no trabalho de defesa da concorrência.
Quanto à legislação sobre as práticas concorrenciais, é necessário que haja atualização, para adequar as normas brasileiras aos padrões internacionais e às novas exigências do mercado competitivo. Nesse aspecto, a proposta feita pelo Poder Executivo é boa e se ajusta ao que o mundo está praticando sobre a matéria. Porém, a crise internacional mostrou pontos vulneráveis em relação à regulação da concorrência no setor financeiro (bancos, seguradoras, instituições de previdência, etc.), e isso recomenda que o projeto do governo, retocado há mais de quatro anos, seja revisado e atualizado, para evitar o risco de aprovação de uma lei que já nasça velha.