Enquanto o Brasil aproveitava o feriado prolongado de Tiradentes – consagrado por ter participado de uma revolta contra a sanha arrecadatória da Coroa portuguesa –, a presidente Dilma Rousseff sancionou o Orçamento Geral da União com uma inclusão que teria enfurecido o inconfidente mineiro: a verba do Fundo Partidário, que em 2014 foi de R$ 289 milhões, dinheiro do contribuinte a ser dividido entre os partidos, foi triplicada para R$ 867 milhões. O acréscimo ao Orçamento feito pelo relator, o peemedebista Romero Jucá, passou ileso pela caneta presidencial.
Em ocasiões anteriores, Dilma veio a público dizer que, a partir de agora, o povo teria de fazer a sua parte no ajuste fiscal, já que até então o governo vinha absorvendo todo o impacto (em parte porque aguentar o tranco em 2014 sem prejudicar o cidadão era importante para garantir a reeleição com o discurso de que a economia não tinha problemas). Mas, ao triplicar a verba do Fundo Partidário, o Congresso que aprovou a medida e a presidente que a sancionou mandam um recado muito claro à população: os partidos, bem, estes não precisam fazer sua cota de sacrifício em nome da necessária economia de recursos públicos.
O PT só desistirá do dinheiro das empresas se puder compensá-lo com o dinheiro do pagador de impostos?
O maior beneficiário de tanta generosidade, para surpresa de ninguém, é o PT: em 2014, a legenda recebeu R$ 50,3 milhões; com o Fundo Partidário turbinado, o partido teria direito a R$ 117,4 milhões (em seguida, vêm o PSDB, com R$ 96 milhões, e o PMDB, com R$ 94 milhões). Não é à toa que a bancada petista pressionou Dilma para que sancionasse o Orçamento sem vetar o aumento na verba destinada aos partidos. Em parte, porque o partido teme multas milionárias como consequência das investigações da Operação Lava Jato, em que o PT aparece como protagonista de um suposto esquema de propina na Petrobras, com empreiteiras pagando pedágios para conseguir contratos da estatal. Além disso, o partido espera aprovar, em seu congresso marcado para junho, o fim das doações de empresas para diretórios municipais, estaduais e nacional do PT. Parece uma questão de princípio, mas o líder do PT na Câmara, Sibá Machado, deixou subentendido que a iniciativa só seguiria adiante se o Fundo Partidário fosse anabolizado: “Nesses termos [sem veto ao Fundo Partidário], o congresso do PT deve ratificar essa decisão de proibir doação empresarial”, disse Machado. Outro dirigente petista foi mais explícito: “Manter a proibição de doação de empresas para o PT depende de esse veto não ocorrer “, disse ao jornal O Globo. Diante disso, fica a pergunta: e se Dilma tivesse vetado esse trecho do Orçamento? O PT só desistirá do dinheiro das empresas se puder compensá-lo com o dinheiro do pagador de impostos?
Na verdade, há a possibilidade de que a torneira não seja aberta em sua totalidade. O vice-presidente Michel Temer, depois de zombar da inteligência dos brasileiros argumentando que “as importâncias [do novo Fundo Partidário] não são tão significativas [no contexto do ajuste fiscal]”, disse também que parte do dinheiro poderia ser contingenciado, ou seja, não ser liberado – o que enfureceu Renan Calheiros, presidente do Senado, para quem Dilma “fez o que havia de pior”. “Ela deveria ter vetado”, afirmou Calheiros, e com razão. Afinal, ainda que haja contingenciamento, a aprovação do novo Fundo Partidário indica que, na visão de Dilma, os partidos têm, sim, direito a essa polpuda verba pública. Se os tempos não fossem tão bicudos, ela lhes daria facilmente o butim inteiro, pouco menos de R$ 1 bilhão.
Esse escárnio com que Dilma e os partidos políticos tratam o cidadão brasileiro mostra o que há de errado com nosso sistema partidário, em que é dificílimo criar novas legendas, mas, uma vez que elas conseguem entrar no jogo, recebem todo tipo de benesse. Em um sistema ideal, a criação de partidos deveria ser facilitada, mas sua manutenção dependeria do esforço de seus membros e filiados, daqueles que compartilham de seus ideais. “A democracia tem um custo”, tentou argumentar o petista Sibá Machado. Mas por que tem de ser sempre o contribuinte a bancá-lo?
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