Líderes políticos paranaenses têm o que aprender com catarinenses e gaúchos na busca por recursos e investimentos
Conta-se do Concílio de Bizâncio, no século 4.º, que os bispos e teólogos que dele participavam procuravam descobrir, dentre outras irrelevâncias, quantos anjos cabiam na cabeça de um alfinete. Daí a expressão "discussão bizantina" para definir a inutilidade de certas polêmicas que, vez ou outra, tomam conta da cena política. A mais atual diz respeito à distribuição de recursos federais entre os estados o Paraná reclama ser constantemente preterido nos repasses orçamentários pela União, favorecendo outros estados que, comparativamente ao nosso, são demograficamente menores ou menos contribuem na arrecadação de impostos, ou para o desenvolvimento do país.
A reclamação parece fazer todo o sentido. De fato, embora seu território ocupe apenas 2,6% da extensão do país, é o Paraná responsável pela geração de quase 40% da energia hidrelétrica brasileira e por 25% da produção de grãos. Só esses dois fatores já são suficientes para demonstrar que grande parte das luzes que se acendem e das indústrias que se movem para gerar riquezas Brasil afora usa a energia aqui produzida, sem falar na segurança alimentar que proporcionamos ao país e das exportações agropecuárias que garantem os superávits da balança comercial.
Seguindo tal raciocínio, seria naturalmente de esperar que o Paraná fosse melhor aquinhoado pela União relativamente a outras unidades da federação menos representativas. É o caso citado pelo governo do Paraná: dos três estados do Sul, o nosso ocupa o terceiro lugar nos investimentos da União embora tenhamos potenciais semelhantes aos do Rio Grande do Sul e o dobro daqueles de Santa Catarina.
Mas é exatamente nesse ponto que se encontram os primeiros traços da mentalidade bizantina com que a questão é encarada. Ela não pode ser vista meramente como aritmética, pois a defini-la existem outros fatores que precisam ser reconhecidos. Um exemplo: por que o estado de Santa Catarina é mais beneficiado que o Paraná? Entrevista com o governador daquele estado, Raimundo Colombo, publicada na Gazeta do Povo do último domingo, contém algumas explicações: é ele, pessoalmente, que seguidamente vai a Brasília em busca de recursos e de agilidade nas decisões federais que envolvam os interesses catarinenses. A receita, ao que tudo indica, tem dado ótimos resultados.
Além de tal fator, há outros a explicar o pretenso privilégio concedido ao Rio Grande do Sul, pois convenientemente tentamos desconhecer dois diferenciais com que os gaúchos nos superam. Primeiro, o sentimento de união e luta pelas causas do estado por parte de seus políticos, independentemente das cores partidárias ou das rivalidades internas. O segundo motivo deriva do primeiro: é em razão dessa união que o Rio Grande do Sul detém apenas para citar um exemplo clássico mais universidades mantidas pelo governo federal que o Paraná. Os paranaenses, ao contrário, deixaram passar oportunidades ímpares para que as nossas (dispendiosas) estaduais fossem federalizadas. Torna-se, assim, mais fácil compreender o porquê de a destinação de recursos federais, obrigatoriamente, ser maior para os gaúchos que para os paranaenses.
Portanto, a aritmética bizantina não se sustenta. Ela é efeito e não a causa. Não adianta contar quantos reais do orçamento da União cabem ao Paraná e verificar que, em alfinetes até menores, cabem mais. A causa está na postura política que historicamente assumimos, ora sobrepondo aos interesses maiores do estado as desavenças político-partidárias que nos dividem, ou, simplesmente, pela falta de articulação dos que detêm mandatos para nos representar aí incluídos os parlamentares paranaenses com assento no Congresso.
Um fato recente nos anima a imaginar que, tivéssemos sempre o mesmo comportamento, a realidade paranaense seria outra. Esse fato é a criação do Tribunal Regional Federal com sede no estado fruto de um trabalho unido e integrado de todos os paranaenses com voz e vocação para lutar pelo que nos diz respeito. A sociedade civil, o governo estadual, os ministros paranaenses, os deputados e senadores se uniram em prol do nosso TRF e o resultado foi a aprovação dessa antiga reivindicação.
Trata-se de um exemplo positivo, pronto e acabado que precisa ser replicado com constância e determinação em tudo que diga respeito ao interesse coletivo dos paranaenses.