Quando parecia que o episódio da corrupção nas emendas parlamentares, para a compra superfaturada de ambulâncias destinadas a prefeituras do país, iria dominar o cenário político no fim de semana, surgiu um novo foco de incêndio: a entrevista do ex-secretário-geral do PT, Sílvio Pereira, ampliando o escândalo do mensalão denunciado ano passado pelo ex-deputado Roberto Jéferson e que já resultou em forte transtorno para o governo Lula. Ambos os assuntos pedem acompanhamento rigoroso: no primeiro, para, além da punição dos culpados, levar à remoção das causas que ensejam essa corrupção miúda mas nociva ao interesse público; no segundo, para fixar de vez a responsabilidade das lideranças que atuaram no valerioduto.
O episódio das ambulâncias superfaturadas que resultou na prisão de meia centena de ex-deputados, funcionários do Congresso e do Ministério da Saúde e tem pendente uma lista que compromete 20% dos membros da Câmara Federal dramatiza a distorção federativa a que o Brasil chegou, ante a excessiva centralização de poderes e recursos na União em prejuízo de estados e municípios. No limite trata-se de má organização política a ser enfrentada numa revisão constitucional, se quisermos retomar o desenvolvimento com estabilidade democrática.
Por isso não basta apenas investigar amplamente e punir com rigor os envolvidos na falcatrua, sejam eles congressistas, empresários, assessores parlamentares ou funcionários públicos. É preciso mais, remover as causas que dão ensejo a tais formas de corrupção, sob pena de continuarmos a assistir periodicamente a desvios e fraudes, sem que o desperdício de dinheiro público seja estancado. Tais situações configuram a ponta de um imenso "iceberg" em que a sociedade arca com tributos cada vez mais onerosos sem receber de volta serviços públicos de qualidade; tudo contribuindo para perpetuar a ineficiência de gestão, a desigualdade na estrutura social e a estagnação no crescimento do país.
No caso da ampliação das denúncias em torno da corrupção operada pelo empresário mineiro Marcos Valério, o ex-secretário-geral petista Sílvio Pereira concedeu entrevista ao jornal O Globo, neste fim de semana, com o mesmo potencial explosivo do desabafo feito em meados do ano passado pelo então presidente do PTB e deputado Roberto Jéferson. O elenco de novas informações tornadas públicas pelo ex-dirigente do partido no poder já deu ensejo à marcação de data para seu depoimento perante a CPI dos Bingos a única do caso ainda em funcionamento no Congresso e poderá levar à expansão da denúncia formulada pelo Ministério Público contra as pessoas citadas, após investigação anunciada pelo procurador-geral da República.
Ambas as situações são penosas para a cidadania brasileira, em sua maioria empenhada em consolidar o pluralismo democrático num ambiente de respeito às leis e valores éticos, que tornam a atividade política digna de ser exercida pelas pessoas de bem.