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O ex-presidente do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva conversa com o presidente da Argentina, Alberto Fernández.
O ex-presidente do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva conversa com o presidente da Argentina, Alberto Fernández.| Foto: EFE/ Juan Ignacio Roncoroni

Simón Bolívar (1783-1830), nascido em Caracas (atual Venezuela), é considerado – sobretudo nos países em que ele ocupou cargos – o principal personagem na luta pela libertação do continente latino-americano contra o domínio espanhol, que durou até 1824. Nos últimos anos de sua vida, desolado com o fracasso do projeto unificador dos países em razão da mesquinharia política e da prevalência de interesses pessoais dos líderes caudilhos regionais, Simón Bolívar desabafou, amargurado: “A América Latina é ingovernável. A única coisa que se pode fazer na América é emigrar”, e o grande líder viu o declínio de seu poder e viveu seus últimos tempos em solidão, sem povo e sem aliados.

Compreender por que a parte latina do continente americano não conseguiu ter o mesmo desenvolvimento da Europa ocidental, dos Estados Unidos e do Canadá, mesmo com abundantes recursos naturais, sempre foi um desafio intelectual para historiadores, economistas e sociólogos e outros estudiosos. O passar do tempo e a observação das experiências políticas e econômicas até este início de terceira década do século 21 permitem algumas conclusões que, se não são as únicas, são as mais importantes para explicar a permanência do atraso.

Na América Latina, políticas equivocadas e malsucedidas foram praticadas por políticos, burocratas e governantes populistas sempre em nome do combate à pobreza e desigualdade, mas o resultado foi o aumento da pobreza e da desigualdade

Em linhas gerais e sem descartar outras causas também importantes, a estrutura estatal, os modelos de governo, a organização político-partidária, o populismo político e a apropriação dos recursos públicos por grupos de interesse, corporações e classes estão na base do baixo desempenho econômico e elevado grau de pobreza e atraso de praticamente todos os países latino-americanos. Quando Simón Bolívar identificou o poder avassalador da estrutura política, seus caudilhos e suas oligarquias sobre a impossibilidade de progresso material, moral e intelectual dos países da região, ele deu a primeira pista para o que viria a ocorrer na sequência: dois séculos de atraso econômico, subdesenvolvimento educacional, pobreza social, inclinação para ditaduras, instabilidade política, maus governos e incapacidade de gestão econômica eficiente.

Os países que compõem a América Latina não se desenvolveram em ritmo e intensidade iguais, de forma que há alguns poucos que conseguiram bom grau de crescimento econômico e desenvolvimento social. Porém, apesar das diferenças, praticamente não há nenhum dos países dessa região que tenha se igualado ao padrão de renda por habitante dos países desenvolvidos. Vale citar um caso bastante peculiar de equívoco, que é a Argentina. Dotada de grande extensão territorial, terras férteis, população com cultura superior em comparação com a média da região, primeiro país a eliminar o analfabetismo, a Argentina chegou a ser rica no padrão dos melhores do mundo (nos anos 1950, o país tinha renda por habitante no nível dos Estados Unidos e do Canadá) e apresentava as condições para equivaler-se ao padrão de Dinamarca, Suécia, Inglaterra ou outro país similar. A derrocada e a descida consistente rumo à baixa renda por habitante, crises, atraso e pobreza fazem da Argentina um caso ímpar de país que enriqueceu, criou as condições para seguir rico, mas trilhou o caminho oposto até o ponto extremo de atingir, em 2021, taxa de pobreza de 46% de sua população. Esse porcentual de pobres é padrão de países quase miseráveis e sem perspectivas. Como tal trajetória perversa aconteceu com a rica Argentina, que houvera conseguido construir uma nação desenvolvida na América do Sul antes dos anos 1950, é evento estranho e propício para observação e estudo.

É útil examinar as causas que levaram esse país vizinho cheio de recursos a trilhar um caminho tão nocivo para seu povo, até para se saber o que um país não deve fazer. A lista de erros é imensa. Políticos demagógicos; governos populistas; experiências ditatoriais malsucedidas; fechamento da economia, setor estatal inchado e ineficiente; paixão por estatização; desprezo pela economia de mercado; déficits públicos constantes; ambiente desfavorável ao investimento e ao empreendedorismo; governos contrários à inserção internacional; hostilidade ao capital estrangeiro; moratória da dívida externa; má gestão macroeconômica; inflação; descontrole na emissão monetária; sindicalismo truculento; domínio do país por caudilhos; corrupção em alta escala; desapropriação de empresas; confisco de fundos de investimento; confisco de poupança; tributação excessiva – essas são algumas doenças que a Argentina vem cultivando há décadas e das quais parece nunca conseguir se livrar.

Com algumas variações, o figurino argentino foi e continua sendo adotado por outros países latino-americanos, sem que suas lideranças políticas, empresariais e intelectuais consigam perceber que suas práticas políticas e econômicas nunca enriqueceram qualquer país. Embora com um povo culto e bom nível educacional, a Argentina não resistiu, entrou em processo de empobrecimento e chega à atual década em condição similar à de países pobres, sem perspectiva de reversão e melhorias em curto prazo. Essa lista é como uma espécie de cardápio dos vícios que um país deve evitar pelo provado enorme poder destrutivo sobre seu futuro e sua população. Na América Latina, essas políticas equivocadas e malsucedidas foram praticadas por políticos, burocratas e governantes populistas sempre em nome do combate à pobreza e desigualdade, mas o resultado foi o aumento da pobreza e da desigualdade. São lições e exemplos do que o Brasil não deve fazer, apesar de ainda hoje haver muitos candidatos a cargos legislativos e executivos tentando se eleger propondo as mesmas coisas.

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